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Crítica teatro "Dorotéia" mostra a potência atemporal de Nelson Rodrigues LUIZ FERNANDO RAMOSCRÍTICO DA FOLHA O ouro do dramaturgo. "Dorotéia", montagem da última das ditas "peças míticas" de Nelson Rodrigues (1912-80), faz luzir uma obra esquecida, clássico da dramaturgia brasileira moderna. Iniciada em 1947 e só encenada pela primeira vez em 1950, no Rio, a peça demarca o fracasso mais retumbante entre os havidos nas encenações daqueles textos. A singularidade de "Dorotéia" é que, mesmo alinhada com as tragédias mais conhecidas de Nelson, ele a assume como uma "farsa irresponsável". De fato uma tragicomédia, é a sua mais ousada experiência com a forma dramática. A estranheza começa no ambiente ficcional: uma casa de viúvas em que não há quartos, só salas, pois as moradoras não suportam pensar que, por dentro dos vestidos, estão seus corpos nus. O pudor exacerbado emoldura a chegada de Dorotéia, parente perdida na prostituição que traz marcas de pecadora e ardor de penitente. O espetáculo de João Fonseca respeita a íntegra do texto e seu caráter barroco. Em vez dos incestos reais, as perversões ali são imaginárias, e a figura masculina só pode aparecer substituída por um par de "botinas desabotoadas". Há que desenhar tudo com traços e cores fortes. As viúvas são interpretadas por atores, o que dispensa as máscaras previstas por Nelson para caracterizar suas "faces horrendas". Gilberto Gawronski, a viúva dominante e antagonista de Dorotéia, tem desempenho impecável na chave do exagero. Alinne Moraes é uma Dorotéia exuberante, cuja beleza fulmina a feiura do coro de viúvas e da menina morta viva que com elas apodrece. Uma dramaturgia vale pelo que ela guarda, em potência, para ser encenado em qualquer época. Esta montagem desvenda a majestade de "Dorotéia" não só diante da obra e do tempo de Nelson como frente ao teatro do nosso tempo.
DOROTÉIA |
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