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36ª Mostra de SP

crítica/drama

Diretora cria personagem frágil e fica cheia de dedos ao tratar de adultério

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Nada mais delicado do que os filmes delicados. Sarah Polley fez um dos mais difíceis e bem-sucedidos do gênero, "Longe Dela", no qual trata de uma mulher vitimada pelo mal de Alzheimer.

Sem sair do registro, buscou agora uma história mais, digamos, vital para "Entre o Amor e a Paixão".

Não é uma tradução das melhores para o original "Take This Waltz". Na verdade, a personagem de Michelle Williams, Margot, está mais entre dois amores: do marido, Lou, e de seu vizinho Daniel.

Como Polley é também a autora do roteiro, alguns aspectos permanecem um tanto enigmáticos.

Primeiro, a profissão de Daniel, um puxador de riquixá. Talvez seja um negócio rentável no Canadá, mas transmite uma sensação de estranheza quase insuperável. O fato é que Daniel, à parte puxar o riquixá, também é artista. Um artista covarde, ele admite, que não tem coragem de mostrar o que faz.

Sendo uma artista, Sarah Polley devia saber que "artista sem coragem" não existe. Não é artista, em todo caso. Sua arte entra aí apenas para, com um desenho, mostrar Margot como uma mulher dividida.

Aceitemos. À parte dividida, Margot é uma mulher que, diz ela, pretende ser escritora. Ou seja, não faz nada de produtivo (inclusive não escreve). Então, quando os dois se encontram, numa viagem, durante a representação de um castigo por adultério, pode-se perguntar o que estava ela fazendo por lá. Tomando notas?

Aceitemos. O certo é que Polley, por alguma razão, dá voltas e mais voltas para chegar à questão central: o adultério. Margot, embora ame o marido, um bem-sucedido autor de livros de culinária, sente-se fortemente atraída pelo vizinho. O que é isso? Se não falta amor, o que pode justificar a traição?

A resposta não precisa ser dada pelo filme (embora Geraldine, cunhada de Margot, ensaie uma no final), filmes não são feitos para isso.

Mas o que parece vigorar aqui, mais do que delicadeza, mais do que "sensibilidade", é mesmo uma diretora cheia de dedos diante do tema incômodo.

Ou talvez a personagem de Margot, de composição um tanto frágil, não saiba nos comunicar o que seria o centro de fato do filme: a existência de um mistério do feminino, de um hiato, um vazio tão evidente quanto, para a velhice, misteriosos são os vácuos que, mais do que apagar a memória, apagam a vida da pessoa e evocam a hipótese, nada agradável, de que a vida não seja, afinal, nada.

O que era notável em "Longe Dela" era a percepção desse abismo que o filme trazia. Nisso, "Entre o Amor e a Paixão" passa liso.

ENTRE O AMOR A PAIXÃO
DIRETORA Sarah Polley
PRODUÇÃO Canadá, 2011
QUANDO hoje, às 21h30, no Cine Livraria Cultura, e dia 31/10, às 21h15, no Espaço Itaú de Cinema - Frei Caneca
CLASSIFICAÇÃO 12 anos
AVALIAÇÃO regular

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