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Vítima de violência é tema de instalação

"Plegaria Muda", da colombiana Doris Salcedo, em cartaz na Estação Pinacoteca, revê papeis na guerra urbana atual

Artista tenta fugir da ideia de vítimas '100% puras' ao mostrar que assassinos poderiam ser também os mortos

FABIO CYPRIANO CRÍTICO DA FOLHA

Em duas salas da Estação Pinacoteca, 120 conjuntos de mesas lembram um cemitério. Cada grupo é composto por duas mesas escuras, uma sobre a outra e, no meio, como uma espécie de recheio, há terra. Graças a ela, uma frágil vegetação cresce nas frestas da mesas.

Trata-se de "Plegaria Muda", instalação da artista colombiana Doris Salcedo, uma das mais prestigiadas de seu país, que já criou obras de impacto na Tate Modern, em Londres, como uma imensa rachadura no piso, em 2008.

A instalação na Pinacoteca, aberta no último sábado e que já circulou por outros cinco museus ao redor do mundo, como no México, na Suécia e em Roma, trata de uma violência urbana que não é desconhecida em São Paulo.

"Quando estive em Los Angeles, há alguns anos, soube de milhares de mortes violentas, especialmente de membros de gangues", diz Salcedo.

Essa experiência trouxe à artista, acostumada a abordar a violência na Colômbia, uma "mudança radical" em sua obra: "Eu sempre abordava a vítima que era pura, 100% vítima; mas, neste caso, encontrei vítimas que também poderiam ser assassinos".

Por isso, as mesas estão dispostas em pares, como a indicar o caráter ambivalente dessas vítimas de "zonas marginais de todas as cidades do mundo".

"Há uma população que não importa a ninguém e ela, como a que vive aqui ao redor [da Estação Pinacoteca], pode até ser composta por contraventores, mas eles também são vítimas, então é preciso ampliar a ideia de vítima."

Para a artista, essas pessoas vivem dentro de um círculo vicioso, "ou mata ou te matam", dentro de um código de ética "estranho à classe média". Com "Plegaria Muda", Salcedo defende que é preciso "assumir que a sociedade deve chorar a todos e a cada um de seus mortos".

Raros são os artistas de renome que, como Salcedo, abordam questões políticas.

Em seu caso, isso se faz de maneira não ilustrativa, mas altamente poética. "Eu me interesso por contar histórias, narrar e representar, o que não se supõe como arte contemporânea, mas faço porque me considero política", diz.

Cada par de mesa, assim, é distinto, para apontar que cada ser humano também é diferente. O tom fúnebre é quebrado apenas pelo verde que cresce pelos buracos.

"Interessa notar que, apesar de tudo, a vida prevalece", conclui Salcedo.


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