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MUTUÁRIOS
Nova lei, que diminui de 10 para 5 anos o tempo de prescrição da dívida, faz bancos notificarem precipitadamente quem tem contrato ativo
Cai prazo para cobrar inadimplentes
AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL
Nas associações de moradores
e mutuários de todo o país, uma
pergunta é cada vez mais comum:
"Recebi um protesto interruptivo
de prazo prescricional do meu
financiador. O que é isso?".
Trata-se de uma medida tomada pelo agente financeiro (em geral, um banco) com o objetivo de ampliar o espaço de tempo para
cobrar a dívida do mutuário antes
de a mesma tornar-se inválida.
O curioso é que, embora o prazo
prescricional só passe a contar
após o fim do prazo de financiamento, muitos mutuários inadimplentes notificados ainda estão com os contratos ativos.
A raiz de tanta preocupação es-
tá no artigo 206 do novo Código
Civil -em vigor desde 11 de janeiro deste ano-, que diminui
de dez anos para cinco anos o
tempo de prescrição da dívida.
Maior agente financiador do
país, a CEF (Caixa Econômica Federal) protestou cerca de 25 mil
(1.670 só no Estado de São Paulo)
contratos por meio da Emgea
(Empresa Gestora de Ativos).
Os contratos, de acordo com a
Emgea, permanecem ativos, e a
notificação seria apenas uma
"medida assecuratória" para a
CEF não perder o prazo.
"É uma precaução desnecessária do agente financiador", esclarece Ronaldo Gotlib, 37, advogado especializado em direito imobiliário e presidente da CAJ (Central de Atendimento Jurídico).
O que o mutuário inadimplente
deve fazer? Segundo o especialista, nada! "É uma notificação sem
sentido e com a qual a pessoa não
precisa se preocupar", afirma.
Leilão
Em contrapartida, ele deve redobrar a atenção a outras duas
correspondências, mais comuns:
a que traz o valor da prestação e a
que informa que, devido à inadimplência, o imóvel vai a leilão.
Nos dois casos, avaliam os especialistas, o mutuário pode alterar
uma situação que lhe é desfavorável com o auxílio da Justiça, embora, em geral, evite essa atitude.
"Em geral, os bancos cobram cifras indevidas, e o brasileiro, passivo, tem preguiça de lutar pelos
seus direitos", diz Roberto Vieira
Machado, 47, diretor da área imobiliária da consultoria Sagy.
Com o aumento das prestações,
aumenta também a inadimplência, muitas vezes resolvida com
o leilão do imóvel. Mas, se conduzido de forma extrajudicial, pode
ser questionado em juízo.
Porém, de acordo com Amauri
Bellini, consultor jurídico da
ABMH (Associação Brasileira dos
Mutuários da Habitação), só 3%
dos mutuários entram na Justiça
pedindo a suspensão do leilão.
A maioria perde o imóvel sem
discutir. "O mutuário tem condição de suspender o processo
administrativo, mas falta esclarecimento", afirma Marcelo Luz,
presidente da ANM (Associação
Nacional dos Mutuários).
Quem dá mais
Ao levar o imóvel a leilão, as instituições financeiras se apóiam no
decreto-lei 70/66, que permite ao
credor readquirir o imóvel por
meio de processo administrativo.
Mas especialistas ouvidos pela
Folha dizem que há conflito com
o artigo 5º da Constituição, no
qual é assegurado que "nenhum
cidadão será privado de seus bens
sem o devido processo legal".
"Hoje a grande maioria dos juízes em São Paulo se posiciona
contra o leilão", diz Marcelo Donizetti, presidente da Ammesp
(Associação dos Mutuários e Moradores do Estado de São Paulo).
Embora o decreto tenha o suporte do STF (Supremo Tribunal
Federal), existe, segundo o advogado Ronaldo Gotlib, uma "tese
de inconstitucionalidade" que
orienta a decisão da maioria dos
juízes em favor do mutuário.
Não há um levantamento que
indique quantas dessas causas
são ganhas ou perdidas pelos mutuários. Bellini, da ABMH, assegura que 90% dos que entram na
Justiça pedindo suspensão do leilão permanecem no imóvel.
As instituições financeiras contestam. Carlos Eduardo Fleury,
44, superintendente-geral da
Abecip (Associação Brasileira das
Entidades de Crédito Imobiliário
e Poupança), diz que só 10% ganham ações em caráter definitivo.
"A suspensão pode até ocorrer,
mas é uma decisão provisória. A
lei permite ao credor essa possibilidade. A constitucionalidade do
decreto 70/66 pode ser discutida
na primeira instância. Mas uma
liminar não resolve a questão, e o
mutuário, no final, perde a ação."
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