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A história dos medos alimentares
Histoire des Peurs Alimentaires
480 págs., 25 euros
de Madeleine Ferrières. Ed. du Seuil (França).
Onde encomendar
Livros em francês podem ser encomendados, em
SP, na livraria Francesa (0/xx/11/3231-4555).
Philippe-Jean Catinchi
do "Le Monde"
Mistura sem dosagem de temor
preciso e ansiedade difusa",
em que razão e irracionalidade
estão inextricavelmente ligados, o medo tornou-se recentemente objeto de história por si só, apesar de os trabalhos pioneiros de Jean Delumeau ["O
Medo no Ocidente", Cia. das Letras" terem negligenciado a noção de risco alimentar. Os trabalhos iniciados por instigação de Jean-Louis Flandrin ["História
da Alimentação", ed. Estação Liberdade", dos quais o alimento -produções,
códigos e ritos- foi o último campo de
estudo, certamente estabeleceram que,
ao medo da fome, substituiu-se o do alimento insalubre. Mas se deve aceitar essa lógica simplista e recusar aos homens
ameaçados em sua subsistência a consciência da nocividade do produto avariado, impuro, corrompido?
Tentando trazer elementos para uma
resposta a essa interrogação, Madeleine
Ferrières, em "Histoire des Peurs Alimentaires" [História dos Medos Alimentares", não teve medo de ultrapassar
os sacrossantos limites de sua especialidade. Tendo o cuidado de evitar qualquer transposição apressada, a professora de história social na Universidade de
Avignon recusa a lógica do "perigo certeiro" antes da revolução de Pasteur, já
que até lá "quase tudo é risco".
Para se convencer disso, basta acompanhar a autora quando estuda os regulamentos medievais dos açougues. O
apaixonante estudo da tabela de Mirepoix permite traçar os contornos das
proibições alimentares, estabelecer o
consumo de carne fresca (carneiro, boi e
porco), descobrir que controles sanitários determinam a qualidade das carnes... e avaliar a parte que a fantasia exerce na representação do contágio entre o
animal e o homem.
A pesquisa confirma a estreita vigilância de uma corporação que deve assegurar o frescor da carne e responder ao triplo tabu do sangue derramado, do temor
da lepra e do risco de impureza se os onívoros se alimentarem de carne animal;
daí a suspeita tenaz em relação ao porco,
cujo nome serve paradoxalmente para
discriminar os judeus, que o classificam
entre suas proibições alimentares.
A carne não é o único alimento questionado: as novas plantas preocupam, e
as recomendações científicas nada podem contra a prevenção em relação ao
desconhecido. As principais vítimas são
a batata e o chocolate. Mas aí é preciso falar em aversão, mais que medo.
A fábula assustadora dá lugar no século 19 aos requisitos higienistas que pesam ainda mais porque a imprensa, novo poder, dita e amplia os temores, na
época ainda frequentemente mudos.
Ao oferecer uma perspectiva tão nova
quanto convincente, Ferrières traz uma
chave capital para compreender os desafios contemporâneos. E, ao fazê-lo, cruza
as heranças historiográficas com inteligência e uma rara pertinência.
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.
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