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Ponto de fuga
A alma das toneladas
A Exposição Universal de Paris de 1889 significou o triunfo dos engenheiros; os arquitetos tomaram conta da exposição seguinte e vingaram-se: o resultado maior foi o Grand Palais
JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA
A
Exposição Universal de
Paris que ocorreu em
1889 significou o triunfo
dos engenheiros. Mostraram-se capazes de formidáveis
proezas, construindo edifícios
prodigiosos, dentre as quais a
torre Eiffel.
Apavoraram-se os arquitetos
com essa preponderância da
engenharia. Sentiam que estavam perdendo terreno. Gritavam: "Arquitetura é arte e isso
não é arte porque não é arquitetura". "Nós é que somos os
artistas", berravam, "não esses
técnicos de esqueletos metálicos". Tomaram conta da exposição seguinte, a de 1900, e vingaram-se.
O resultado maior foi o
Grand Palais, que, como a célebre torre, sobreviveu até agora.
Devia apresentar uma "tecnologia avançada", como se diz
hoje, para que os arquitetos demonstrassem serem também
modernos. Mas precisava ostentar ornamentos, esculturas,
colunas e capitéis, para garantir a presença da "arte".
Quatro arquitetos se reuniram. Conceberam um arcabouço magnífico em metal e vidro
para uma nave imensa. Ele seria porém cinturado por um invólucro de pedra, ostentando
uma larga colunata e uma quadriga no cocoruto. Era a "arte"
escondendo a técnica, que se
revelava só no interior.
Maravilhoso ver como, para
sustentar o balcão interno, certas estruturas metálicas enlaçam algumas colunas. A luz
atravessa a formidável vidraça
do alto. A sensação é aérea.
Homem de ferro
O escultor norte-americano
Richard Serra instalou cinco
imensas placas verticais de aço,
com 17 metros de altura e 4 metros de largura, na nave do
Grand Palais. Pesam 75 toneladas cada. São finíssimas e repousam sobre o solo sem que se
perceba qualquer apoio. Permitem intuir espessura e peso,
mas parecem se mover lentamente, porque cada uma inclina de leve seu eixo para a esquerda ou para a direita.
A obra chama-se "Promenade" (Passeio).
A abóbada do Grand Palais é
uma gigantesca renda metálica
que parece não pesar. Sob ela,
as placas de Serra se oferecem
como matéria e massa opacas,
fixadas no chão, sugerindo oscilações misteriosas.
Flagrante
Menahem Pressler e Antonio
Meneses juntaram-se para gravar a obra integral para piano e
violoncelo de Beethoven (Clássicos Editorial). Um álbum que
se inscreve na lista dos discos
permanentes e essenciais.
A beleza se impõe com imediata evidência. Nas primeiras
notas inicia-se a perfeita associação que não cessa. Comunhão de timbres e comunhão
de espíritos: os sons brotam
carregados de sensualidade larga, que sabe fazer-se também
grave e meditativa.
Flúmen
A revista "Opéra Magazine",
publicada em Paris, tem enorme autoridade entre o público
da ópera no mundo inteiro. É
muito bonita; todas as críticas,
analíticas, severas, vêm acompanhadas de ilustrações expressivas.
O número de junho trouxe
um dossiê de quatro páginas
sobre o festival de Manaus.
Tom entusiasta: "A metrópole
brasileira (Manaus) pôs todos
os trunfos de seu lado para figurar entre os faróis culturais da
América Latina". "Ficamos impressionados pela qualidade da
orquestra (Amazonas Filarmônica), dirigida por Luiz Malheiro, cujas riqueza e plenitude
das sonoridades nunca se exercem em detrimento das vozes."
O Festival de Manaus completou 12 anos: milagre de continuidade neste país que adora
a palavra "evento" e tem dificuldades na persistência a longo prazo dos projetos culturais.
A "Opéra Magazine" confirmou o que, de fato, está ocorrendo hoje: o centro brasileiro
do teatro lírico deslocou-se para a Amazônia.
jorgecoli@uol.com.br
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