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ASTRÔNOMO BRITÂNICO MARTIN REES DEFENDE A IMPOSIÇÃO DE LIMITES À CIÊNCIA; SEGUNDO ELE, HÁ UMA CHANCE EM DUAS DE UMA CATÁSTROFE SEM PRECEDENTES AINDA NESTE SÉCULO
A EXPLOSÃO DO HUMANO
Associated Press - 8.set.1945
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Homem observa estragos causados pela bomba atômica jogada sobre a cidade de Hiroshima, no Japão, em 1945 |
Salvador Nogueira
da Reportagem Local
Nos próximos cem anos, há uma chance em
duas de que grandes incidentes, acidentes ou
conflitos causem um considerável retrocesso
à sociedade altamente tecnológica do mundo
contemporâneo. Provavelmente não seria a extinção da
espécie, mas vários passos atrás na escalada histórica
que conduziu às maravilhas e desventuras do pós-moderno século 20 e além. O portador das más notícias é
sir Martin Rees, astrônomo da Royal Society e do King's
College da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Ele tem uma polêmica sugestão para minimizar riscos: impor freios à ciência antes que seja tarde demais.
De todo modo, diz ele, a civilização humana está a um
passo de concluir sua passagem pela Terra. Mesmo que
o homem escape às iminentes catástrofes que se abaterão sobre ele nos cem anos vindouros, também estará
condenado ao desaparecimento. Em seu lugar, emergiria um novo ser humano, artificialmente evoluído e
equipado com toda sorte de interfaces biônicas.
Se sobrevivermos a nós mesmos e às nossas máquinas
cada vez menores e mais perigosas, temos um encontro
marcado com esse nosso futuro pós-humano em cem
anos, afirma Rees. Antecipando o tortuoso caminho até
lá, o astrônomo real (título concedido pela coroa britânica que, desde 1972, tem caráter apenas honorário) decidiu empregar seus esforços na tentativa de reduzir os
traumas que o século 21 deve trazer. Daí nasceu "Our
Final Hour" (Nossa Hora Final), livro lançado em março nos EUA e sem previsão de publicação no Brasil.
O subtítulo deixa claro o recado: "Alerta de um cientista: como terror, erro e desastre ambiental ameaçam o
futuro da humanidade neste século -na Terra e além".
No livro, Rees destaca os principais temores provenientes das novas tecnologias e questiona o ritmo em que a
ciência avança em alguns campos. Para ele, cautela seria
bem-vinda -de preferência partindo dos próprios
cientistas, que costumam lavar as mãos quando o assunto é o modo como sua pesquisa é aplicada por governos, instituições e indivíduos pelo mundo afora.
Questionado sobre o quão ativo esse papel do cientista deve ser, Rees é um pouco mais vago. Ele acredita que
a ação deve ser no sentido de informar o público, para
que a população possa então decidir quais são os ramos
do conhecimento que devem ser perseguidos, e quais
são os que devem ser vetados. "Não estou certo de que
precisemos de uma moratória. Há certos tipos de ciência que queremos controlar por razões éticas", diz.
"Mas acho que precisamos ser muito cuidadosos com
as aplicações da ciência, e as aplicações da ciência deveriam ser decididas não pelos cientistas, mas por uma
comunidade mais ampla."
Em seu alerta, Rees usa como parâmetro a ameaça de
uma hecatombe nuclear, tema tão velho quanto o Projeto Manhattan, que criou a primeira bomba atômica,
nos anos 1940. Para o astrônomo, a ameaça de um conflito de escala global deflagrado por armamento nuclear
não morreu junto com a Guerra Fria. Longe disso: ela
tem tudo para voltar com força ainda maior no próximo século. E é só a primeira das grandes ameaças.
Com o avanço das biotecnologias, está cada vez mais
próximo o dia em que será possível conceber armas
biológicas tão letais quanto as nucleares, com o incômodo adicional de exigirem investimento muito menor
para serem desenvolvidas. E a nanotecnologia deve oferecer perigos que podem até mesmo extinguir a vida na
Terra, em mais 50 anos. Com toda essa mistura no mesmo coquetel, Rees considera improvável que escapemos incólumes. "Acho que é ingênuo acreditar que vamos ter todos os benefícios sem risco algum", afirma.
As novas tecnologias concentrarão tanto poder num
indivíduo -culminação da filosofia e do modo de vida
que permearam o mundo ocidental nos últimos séculos- que poderão conduzir à derrocada da civilização.
Apesar de o gênio aparentemente já ter saído da lâmpada, há uma chance de que a humanidade consiga escapar do turbilhão e chegar a um admirável mundo novo em cem anos, segundo Rees. Comunidades em colônias espalhadas pelo espaço, alta tecnologia em engenharia genética e a capacidade de elevar a relação entre
homem e máquina a um novo patamar devem ser os ingredientes que criarão o pós-humano, uma figura tão
assustadora quanto inevitável, argumenta. Se a civilização tecnológica sobreviver aos próximos cem anos, a
seleção natural daria lugar a novos mecanismos, artificiais, para a próxima fase na evolução. O que emergirá
disso, nem Rees se arrisca a prever.
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