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Benjamin Steinbruch
Contramão
Quem ganhar a eleição terá de reduzir os juros; do contrário, correrá o risco de enfrentar recessão no 1º ano
Em plena Copa do Mundo, é impossível deixar de acompanhar os problemas da economia. É mais do que preocupante o atual cenário da indústria brasileira. Um pouco antes do início do Mundial, ficamos sabendo, pelo IBGE, que a produção industrial teve uma nova queda em abril, de 0,3% em relação ao mês anterior. Na comparação com maio do ano passado, a queda é de 5,8%.
A preocupação com a indústria aumenta porque seu ambiente recessivo se espalha praticamente por todas as regiões e todos os setores.
No ainda importante setor de veículos, os números de maio mostraram uma queda de produção de 18% na comparação com o mesmo mês do ano passado. As empresas tiveram de ajustar sua produção à demanda diminuindo o ritmo de trabalho, parando linhas de montagem e, infelizmente, demitindo empregados.
Quase 5.000 vagas foram fechadas desde o início do ano nas montadoras, que também apresentam queda anual de 24% no faturamento de exportações. Na indústria como um todo, na comparação com o mesmo mês do ano passado, houve em abril uma queda de 2,2%, a 31ª seguida.
Por que tudo isso está acontecendo? Há um discurso, largamente difundido, sobre a falta de confiança do setor empresarial, que se sente inseguro, por muitas razões, para fazer investimentos produtivos. Tudo isso é verdade. Mas há também um fato incontestável, que colabora de forma definitiva para colocar a indústria e toda a economia brasileira no rumo da recessão.
É óbvio que estou falando da falta de crédito e dos juros. Não dá para explicar a ninguém por que, num momento em que tanto os países emergentes quanto os desenvolvidos estão cortando ferozmente os juros, aqui no Brasil continuamos com uma taxa de 11% ao ano. É a maior taxa do mundo, tanto em termos nominais como reais. Todo o mundo desenvolvido opera com taxas reais negativas (abaixo de zero) e alguns emergentes também, como a Índia.
Há duas semanas, o Banco Central Europeu adotou até uma taxa nominal negativa, de 0,10%, para depósitos dos bancos privados. Isso significa que os bancos europeus, para deixar seu dinheiro depositado com segurança no BCE, precisam pagar 0,10% do valor depositado por ano. Enquanto isso, aqui no Brasil, quem comprar títulos do Tesouro, aplicação de risco zero, ganhará 11% ao ano, algo como 4,5% em termos reais (acima da inflação).
Na contramão do mundo, o Brasil vem aumentando a taxa básica de juros desde abril do ano passado. Nesse período, a nossa conhecida Selic passou de 7,25% para 11%, nível atual. O objetivo, nobre, era conter a inflação, que se aproximava e ainda se aproxima perigosamente do teto da meta, de 6,5% ao ano.
Para nossa decepção, o efeito esperado dessa política praticamente não se deu. Enquanto isso, o efeito colateral se apresenta em cheio, colaborando para esfriar a economia e colocá-la no caminho da recessão, como mostram dados citados acima.
A esta altura, nem os analistas mais otimistas preveem um crescimento do PIB de 2% no ano, o que já seria um retrocesso em relação ao fraco desempenho de 2013 (2,3%).
O que fazer? Ora, é elementar: baixar os juros. Se a política de arrocho não está fazendo efeito para segurar a inflação, até porque grande parte dessa inflação decorre de fatores incontroláveis via aperto monetário, então ela é indesejada, já que tem efeito colateral devastador.
As altas taxas de juros têm forte impacto nos custos empresariais, já agravados por energia, câmbio, falta de crédito e outros fatores. Levantamento da CNI mostrou que os custos do capital de giro da indústria aumentaram incríveis 33% no primeiro trimestre em comparação com o mesmo período de 2013. Além disso, o rendimento financeiro real, acima da inflação, obviamente desestimula os investimentos produtivos.
É necessário ter coragem para afrouxar agora a política monetária, numa conjuntura de disputa eleitoral e contra a vontade do mercado financeiro. Qualquer redução da Selic antes da eleição será certamente taxada de medida eleitoreira e, mais ainda, interpretada como atitude de leniência com a inflação.
De qualquer forma, ganhe quem ganhar a eleição presidencial, precisará adotar uma política monetária mais frouxa. Se não fizer isso, na certa enfrentará uma recessão logo no primeiro ano de governo, para decepção de seus eleitores.