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Clóvis Rossi
Abrindo as portas do inferno
O assassinato de três jovens estudantes judeus desperta uma ira que só pode levar a uma reação violenta
Atos de violência contra judeus despertam um grau de ira que, de fora, é difícil de estimar.
Por isso, é razoável supor que o assassinato de três adolescentes sequestrados no dia 18 de junho pode, de fato, "abrir as portas do inferno", como previu nesta segunda-feira (30) o porta-voz do Hamas, Sami Abu Zuhri, ainda que ele estivesse aludindo não à reação aos assassinatos (os corpos ainda não haviam sido encontrados), mas à previsível reação israelense ao disparo de 14 foguetes, lançados de Gaza em direção a solo israelense.
A descoberta dos corpos acrescenta, portanto, um segundo motivo à ira de Israel.
Estaria toda ela voltada para o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica), que governa a faixa de Gaza, não fosse o recente acordo com a Autoridade Palestina, que controla parte da Cisjordânia, para um governo de unidade. Com o acordo, o governo de Israel diz que os palestinos preferiram um acordo com o terrorismo à paz com Israel.
O assassinato dos três estudantes só pode reforçar essa impressão e, no mínimo, tornar ainda mais remota, se fosse possível, a já remotíssima possibilidade de um entendimento entre Israel e a Autoridade Palestina.
A partir de informações das próprias autoridades palestinas, o Shin Bet, serviço secreto israelense, havia identificado Marwan Qawasmeh e Amar Abu Aisha como os sequestradores dos adolescentes. Antes mesmo de divulgar os nomes, as autoridades israelenses já haviam apontado o dedo para o Hamas como responsável pela ação.
O grupo palestino não assumiu a autoria do sequestro, mas louvou a ação, o que dá quase na mesma.
Mas Shlomi Eldar, premiado colunista israelense, prefere atribuir o sequestro ao clã Qawasmeh, que seria composto por cerca de 10 mil pessoas, o que o torna o terceiro mais importante na região de Hebron, em cuja vizinhança se deu o sequestro.
O clã é de fato vinculado ao Hamas, mas tem um histórico de ações violentas por conta própria.
Tem-se aí dois elementos para ajudar a abrir as portas do inferno. Um é a acusação ao Hamas, seguida da pregação do vice-ministro de Defesa, Danny Danon, em favor da "erradicação" do grupo. O outro é a suspeita de que um poderoso clã terrorista, como o Qawasmeh, está instalado não na faixa de Gaza, mas na área de Hebron, a maior cidade da Cisjordânia, na qual um punhado de colonos judeus vive cercado por cerca de 250 mil palestinos.
O fato de que um sequestro, seguido de assassinato, ocorra numa região com essas características machuca a relativa sensação de segurança dos israelenses desde a construção do muro que os separa dos palestinos. Daí ao grito de vingança é um passo.
E, com ele, tornam-se inaudíveis vozes, como a do blogueiro Marc Goldberg, que aponta uma "bizarra contradição" na política israelense: "De um lado, argumentamos que os palestinos são nossos inimigos mortais e, de outro, o governo manda israelenses viver exatamente nas áreas em que aqueles palestinos que querem matá-los acharão mais fácil fazê-lo".