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Análise

Conflito partidário nos EUA atinge leis estaduais sobre eleição

Republicanos dizem que leis mais exigentes evitam fraudes; democratas veem nelas modos de dificultar voto de seus eleitores

A constituição dos EUA confere aos estados o controle sobre quase todo o processo da eleição e os direitos de voto

ALEX KEYSSAR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Uma importante tendência oculta da campanha de 2012 nos EUA é o conflito partidário agudo em torno de novas leis estaduais que dificultam o cadastramento eleitoral e o voto de alguns cidadãos.

Aprovadas por mais de duas dúzias de Legislativos estaduais, as leis exigem novos documentos de identificação do eleitor, reduzem o total de dias em que as urnas ficam abertas ou limitam a capacidade de entidades cadastrarem eleitores antes do pleito.

De modo geral, essas leis têm sido patrocinadas por republicanos, que afirmam que elas são necessárias para prevenir fraudes eleitorais.

Os democratas, pelo contrário, vêm denunciando as leis, que descrevem como uma forma de "supressão de eleitores" visando inibir o voto de grupos -jovens, idosos e pobres- que teriam mais probabilidade de votar neles.

Nas últimas semanas, tribunais em vários Estados rejeitaram essas leis. Na Pensilvânia, um juiz decidiu que o governo estadual não pode implementar nesta eleição a exigência de que todo potencial eleitor possua documento de identidade válido, emitido pelo governo e com foto -porque o Estado não poderia garantir que a lei não prejudicasse alguns cidadãos.

(Nos EUA, diferentemente de muitos países, não há carteiras de identidade ou carteiras de motorista nacionais; apenas cidadãos com passaporte ou carteira de motorista já possuem "documento de identidade emitido pelo governo e com foto".)

As novas leis também foram vetadas em Ohio e no Texas. Em vários outros Estados, porém, foram sancionadas pelas cortes e vigoram.

A variabilidade dessas leis e as batalhas legais que as cercam são legados de características peculiares e cruciais da história americana.

A primeira é que a Constituição dos EUA, redigida no final do século 18, deixou o controle sobre quase todos os assuntos ligados a processos eleitorais e direitos de voto na esfera estadual. É por isso que os requisitos podem ser diferentes em diferentes Estados.

Para tornar tudo ainda mais complexo, a Lei de Direitos Eleitorais, vigente desde 1965, dá a Washington o poder de aprovar ou rejeitar modificações nas leis eleitorais estaduais -mas apenas nos Estados (predominantemente do sul do país) que praticavam discriminação racial declarada nos anos 60.

Desse modo, o governo federal pôde bloquear a nova lei do documento de identidade no Texas, apesar de leis similares em outros Estados.

A maioria dos acadêmicos (incluindo este autor) acredita que as novas leis são, de fato, esforços partidários que visam reduzir os totais de voto dos democratas. Diversos estudos já deixaram claro que a fraude eleitoral não tem sido um problema sério nos EUA nas décadas recentes.

E o único tipo de fraude que um documento de identidade com foto poderia impedir -um impostor no lugar de um eleitor legítimo- tem sido quase inexistente.

Essa nova onda de leis tem sua origem na eleição presidencial disputadíssima e contestada de 2000, que deixou claro que um número minúsculo de votos podia afetar os resultados nacionais.

Desde então, os republicanos procuram modificar os procedimentos de voto de modo que possam desencorajar eleitores de tendência democrata. Aprovaram muitas dessas leis desde 2010 porque naquele ano o partido venceu em vários Estados.

Graças aos tribunais e seus esforços para cadastrar eleitores e obter documentos de identidade para eles, é provável que os democratas impeçam que as leis mais restritivas exerçam impacto decisivo sobre a eleição deste ano.

Mas essas questões não vão desaparecer, e conflitos partidários em torno do voto podem se acirrar no futuro.

ALEX KEYSSAR é professor de história e política social na Universidade Harvard e autor de "The Right to Vote: the Contested History of Democracy in the United States".

Tradução de CLARA ALLAIN

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