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Separação da Catalunha ignora imigrantes
Dos 7 milhões de habitantes da região, 1,5 milhão não poderá votar em consulta por não ter cidadania espanhola
Imigração se acentuou na década de 90, com o boom na construção; depois da crise, muitos ficaram desempregados
O crescente movimento catalão de separação da Espanha tem consequências variadas para Enrique Shen.
É bom para os negócios. No mês passado, antes de um comício pró-independência na vizinha Barcelona, as bandeiras da Catalunha que Shen vende ao atacado se esgotaram: clientes compraram 10 mil delas em uma semana.
Mas, como imigrante que se mudou de Xangai 20 anos atrás, Shen está preocupado com o modo como os separatistas defendem sua proposta, falando de cultura, língua e identidade que diferenciam a Catalunha da Espanha.
"Sempre é melhor fazer parte de um país maior, assim como é melhor ter uma família maior para lhe dar apoio", ele explicou.
Imigrantes como Shen ilustram as complexidades da identidade na Catalunha, onde ajudaram a fazer a principal economia entre as regiões espanholas e uma das populações mais diversificadas, com presença considerável de muçulmanos, sikhs e outros.
Enquanto a Catalunha espera a eleição regional do dia 25, que pode virar referendo extraoficial sobre a independência, até 1,5 milhão de habitantes (dos seus 7 milhões) não poderão votar -não são cidadãos espanhóis.
Cidades como Badalona, na costa mediterrânea a nordeste de Barcelona, ilustram os desafios que a Catalunha enfrenta, seja qual for o resultado da ação separatista.
Em 2011, a cidade de 220 mil habitantes elegeu um prefeito linha-dura, García Albiol, que se opõe à independência e vem lançando uma sombra grande sobre os imigrantes -ele chegou a ser processado por acusações de incitar o ódio contra ciganos.
"A maioria dos migrantes veio para cá para trabalhar, mas uma parte pequena veio com a única intenção de se tornar delinquente, roubando e dificultando a vida dos vizinhos", disse o prefeito.
Para o marroquino Abdelkrim Latifi I Boussalem, a cidade estava tendo dificuldade em aceitar marroquinos e paquistaneses antes mesmo da eleição de García Albiol.
Boussalem defende que os imigrantes recentes tenham o direito de opinar sobre a independência. "Não estamos aqui para diluir a identidade catalã. Estamos dispostos a nos esforçar para entender o lugar onde vivemos. A Catalunha sempre foi uma terra de refúgio e receptividade."
Antes da Segunda Guerra, a Catalunha tinha cerca de 2,9 milhões de habitantes. A população dobrou nas décadas seguintes, recebendo espanhóis das áreas rurais pobres.
No final dos anos 90, a região esteve na dianteira da onda imigratória provocada pelo boom na construção. Esse boom terminou em 2008, com a crise mundial, e muitos dos imigrantes foram embora ou estão entre os 25% de desempregados da Espanha.
Artur Mas, o presidente da Catalunha, disse que não está claro ainda se referendo sobre a separação será aberto aos imigrantes legalizados.
Tradução de CLARA ALLAIN