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Análise
Pacto contornou o "abismo", mas empurra para a frente o problema
KIM DIXON DA REUTERS, EM WASHINGTONNa polêmica em torno do chamado "abismo fiscal", fica fácil esquecer que a origem da discussão toda foi um alegado desejo de enxugar o deficit federal inchado.
Avaliada por esses critérios, a lei aprovada pelo Congresso para evitar os automáticos aumentos grandes nos impostos e cortes abrangentes de gastos públicos, que formariam o "abismo fiscal", parece irrisória.
Segundo o Escritório Orçamentário do Congresso, a legislação acrescenta quase US$ 4 trilhões ao deficit federal ao longo de uma década, comparada à redução da dívida visualizada no cenário extremo do "abismo fiscal".
Isso porque ela estende as alíquotas baixas de imposto de renda a quase todos os americanos, excetuando os relativamente poucos que têm renda anual superior a US$ 400 mil.
E também porque ela adiou por pelo menos dois meses os cortes orçamentários automáticos que faziam parte do "abismo" e que teriam poupado cerca de US$ 109 bilhões em gastos federais com programas de defesa e outros.
A legislação, que acabou se resumindo a uma disputa em torno de equidade de impostos, em vez de gastos federais, fez para a redução do deficit aquilo que Barack Obama e os líderes do Congresso sempre prometeram evitar: empurrou a questão para a frente, para ser resolvida no futuro.
A legislação também prepara o palco para uma disputa provavelmente ainda mais acirrada no final de fevereiro, quando o Departamento do Tesouro terá de ir ao Congresso para pedir que seja elevado o valor da dívida que o governo pode contrair.
Com isso, tudo voltará para o ponto de onde o "abismo fiscal" começou, durante a disputa entre Obama e os republicanos sobre a elevação do teto da dívida federal para acima de US$ 14,5 trilhões.
Essa disputa foi encerrada em agosto de 2011 com um acordo bipartidário projetado para obrigar o Congresso a legislar reduções importantes e de longo prazo nos gastos federais.
A ideia foi que, ao definir um prazo máximo rígido de 2 de janeiro de 2013 e consequências graves, sob a forma de cortes draconianos, se o prazo não fosse cumprido, a Casa Branca e o Congresso fossem forçados a agir.
Mas a controvérsia em torno dos impostos, na esteira de uma campanha presidencial baseada na defesa por Obama de justiça tributária para a classe média, acabou consumindo a discussão sobre o "abismo fiscal", fazendo com que a redução do deficit fosse esquecida.
Tradução de CLARA ALLAIN