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HOMEM-BOMBA
Peter Eass, 28, que vive na Jordânia, promete se explodir e matar invasores em Bagdá
Iraquiano volta em "missão suicida"
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A AMÃ
O iraquiano Peter Eabeae Eass,
28 anos, é um homem com uma
missão. Desde que ouviu na TV
jordaniana na semana passada o
apelo do presidente iraquiano
Saddam Hussein conclamando
mártires do mundo inteiro a irem
para Bagdá atacar os invasores da
coalizão, ele só pensa em uma coisa: se explodir perto do Exército
norte-americano, se matando e
matando com ele o maior número de soldados que conseguir.
"É minha missão como muçulmano", disse ele à Folha ontem à
tarde na periferia de Amã, na Jordânia, momentos antes de embarcar no ônibus que o deixaria
hoje cedo na capital iraquiana.
Eass quer se juntar aos mais de
4.000 soldados suicidas que já estariam em Bagdá, segundo números fornecidos pelo vice-presidente do Iraque, Ezzart Ibrahim,
só esperando o melhor momento
para agir.
Desde sábado retrasado, quando um soldado iraquiano disfarçado de taxista explodiu a si mesmo e matou quatro americanos
em Najaf, pelo menos outros três
ataques suicidas atingiram postos
da coalizão anglo-americana. Anteontem, o ministro da Informação iraquiano deu a entender que
o país usaria tais homens-bomba
para retomar o controle do aeroporto internacional de Bagdá.
Mecânico de formação, mas especializado em explosivos leves e
praticante de caratê há quatro
anos, o iraquiano Eass não tem
problemas de consciência em relação a seu plano: "Nós muçulmanos não encaramos a morte como
vocês [ocidentais"", disse ele.
Eass, que antes havia dito se
chamar Ahmed Hussein, diz que
mora em Amã há sete meses e que
vinha ganhando um bom dinheiro na cidade como reparador de
motores, "uns US$ 1 mil, US$ 2
mil por mês", mas que não se importa de largar tudo e voltar para
um país invadido, no meio de
uma guerra, cujo salário médio
atualmente é de US$ 50.
De olhos vidrados, barba longa,
camisa xadrez, calça jeans e sapatos pretos, conta detalhes de seu
plano para o taxista contratado
pelo repórter, que traduz para o
inglês a conversa, enquanto um
pequeno grupo de motoristas de
ônibus e caminhonetes que fazem
o trajeto Amã-Bagdá-Amã vai se
juntando a seu redor, impressionado com a conversa.
Eass afirma que vai largar a mala (verde-oliva, com os dizeres
"Big John" bordados nos bolsos)
num canto da sala assim que chegar à casa de seus pais e, então, vai
executar seu plano.
Leia trechos da entrevista:
Folha - Você não tem medo de ir a
Bagdá neste momento?
Peter Eabeae Eass - Medo de
quê? De morrer? Mas se é para isso mesmo que eu estou indo lá.
Folha - Você está indo a Bagdá
para morrer? Por quê?
Eass - Estou indo para me matar
e, junto, matar os soldados americanos e britânicos.
Folha - Por quê?
Eass - É minha missão como
muçulmano. Esse é um jihad. O
Alcorão [livro sagrado dos muçulmanos" nos diz que temos de
matar os invasores infiéis de terras muçulmanas, sejam eles americanos, britânicos ou australianos, não importa. Estes soldados
são invasores e merecem morrer.
Folha - Mas se você fizer isso pode
matar civis e pessoas inocentes
junto. Você não pensa na implicação moral de seu ato?
Eass - Nós muçulmanos não encaramos a morte como vocês.
Folha - Você está fazendo isso por
Saddam Hussein?
Eass - Atendendo a um pedido
dele, sim, mas estou fazendo isso
por minha religião e pelo Iraque.
Não me importa quem é o presidente do país, o importante é que
minha terra foi invadida.
Eu não morava mais lá, mas minha família ainda mora. Meus
pais, meus quatro irmãos, que lutaram na Guerra do Golfo, em
1991, e estão lutando de novo, e
minha irmã. Nem sei se eles estão
vivos ou não, pois os telefones de
Bagdá não estão funcionando faz
tempo, mas não importa. Mesmo
se eles não quiserem que eu faça
este sacrifício, eu vou fazer.
Folha - O que você pretende fazer
exatamente?
Eass - Minha vontade era pegar
[o presidente norte-americano
George W." Bush pessoalmente e
cortar seu pescoço. Cortar seu
pescoço, não, morder seu pescoço
e chupar seu sangue. Antes, daria
uma sequência de golpes de caratê [mostra a sequência para o repórter". Faria isso mesmo se fosse
morto no caminho. Como não
posso, me matarei, matando junto comigo seus soldados.
Folha - Você tem namorada?
Eass - (rindo) Não, o verdadeiro
muçulmano não namora, apenas
se casa.
Folha - Você é casado?
Eass - (sério) Não.
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