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RÚSSIA
Megacampeão de xadrez funda movimento político para lutar por uma eleição presidencial "livre e justa" em 2008
Kasparov põe em xeque o regime de Putin
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
É essencial pôr fim ao sistema
autoritário controlado pelo presidente Vladimir Putin e por seus
ex-colegas da FSB (ex-KGB, a polícia secreta soviética) para reconstruir o sistema democrático
russo e para manter os avanços já
obtidos, de acordo com Garry
Kasparov, 41, o enxadrista mais
premiado da história do esporte.
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por e-mail, à Folha.
Folha - Por que o sr. decidiu fundar um movimento político?
Garry Kasparov - A política sempre desempenhou um papel importante em minha vida. Quando
eu era jovem, o xadrez, como tudo na URSS, fazia parte do cenário político. Minha sorte era diretamente afetada pelas ações dos
burocratas, e, desde cedo, percebi
que tinha de ter um papel ativo na
política se quisesse controlar meu
próprio destino. Desde então, tenho participado de várias iniciativas que visam promover as liberdades e a democracia na Rússia.
Minha atividade atual como
presidente da Comissão 2008: Escolha Livre teve origem quando
comecei a observar a desintegração da embrionária democracia
russa sob o regime autoritário de
Putin e de seus ex-colegas da FSB.
Senti-me compelido a usar minha
posição para tentar resistir aos
ataques a nossas instituições e a
meus compatriotas.
Folha - Quais são os principais objetivos da comissão?
Kasparov - O maior objetivo da
iniciativa é fazer com que todos,
na Rússia e no exterior, tenham
consciência do extremo perigo
que o regime de Putin representa
para a democracia. Além disso,
nosso objetivo específico é garantir a realização de uma eleição
presidencial livre e justa em 2008.
Retirar Putin do poder é essencial
para a democracia russa.
O resultado da eleição presidencial de março próximo já está definido por conta da condições
atuais da campanha e do país. Putin e seus asseclas controlam totalmente o processo eleitoral. Talvez seja possível que ele vença
uma eleição aberta e honesta, porém é certo que isso não será necessário desta vez.
Folha - Como o sr. analisa o controle de Putin sobre a mídia e sobre
os empresários?
Kasparov - Ele já é rígido e torna-se ainda mais forte com o passar
do tempo. Reverter esse processo
é essencial para reconstruir o sistema democrático da Rússia e para manter os avanços já obtidos.
Meios de comunicação e empresas que obedecem a certas regras
tácitas recebem benefícios. Os
que criticam Putin ou se recusam
a apoiá-lo têm problemas, sofrendo ingerência do Estado em seus
negócios ou até sendo presos.
Folha - Por que a Tchetchênia não
é um tema central da campanha?
Kasparov - Quando as coisas pareciam ir bem na Tchetchênia, a
imprensa veiculava matérias sobre a questão. Contudo, quando
as coisas vão mal na república
caucasiana, como agora, há um tipo de blecaute. Como a Tchetchênia não é um bom tema para Putin hoje, ninguém toca no assunto. Soldados russos ainda morrem com freqüência na Tchetchênia, e Putin age como se a crise de
segurança atual não fosse, em
parte, uma criação sua.
Folha - O restante da classe política também é culpado?
Kasparov - Sem dúvida, mas há
exceções. O poder de Putin é tão
amplo que é muito arriscado para
qualquer político opor-se à situação. Esperamos que, com nosso
movimento político, possamos
apoiar outras iniciativas e encorajar outras pessoas a falar sobre
nossos problemas, lutando pelo
futuro da democracia russa.
Ainda tenho obrigações ligadas
à minha carreira de enxadrista e a
ações caritativas, e 2004 pode tornar-se um ano muito importante
para minha carreira. Contudo estou comprometido com essa iniciativa e dedicarei o tempo que for
necessário para promovê-la.
Folha - O sr. será candidato a um
cargo público no futuro?
Kasparov - Minha vida ainda será dedicada ao xadrez por alguns
anos. Aos 41 anos de idade, estou
ficando velho para o mundo do
xadrez, porém ainda sou muito
jovem para o da política.
Folha - O sr. não teme represálias
do Kremlin à sua ação?
Kasparov - Na Rússia de Putin,
qualquer pessoa pode ser perseguida ou presa por conta de suas
convicções políticas. Como nossa
ação é pública e notória, o que
quer que seja feito contra algum
membro de nosso movimento
também terá de ser público e notório, o que ajuda a nos proteger.
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