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Uma terceira via palestina
PAULO DANIEL FARAH
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH
Uma terceira via palestina como
alternativa ao governo atual e aos
grupos que defendem a violência
como meio legítimo para pôr fim
à ocupação israelense. A idéia
vem se difundindo nas cidades e
aldeias palestinas da Cisjordânia e
da faixa de Gaza e angariando
apoio para reformas internas e
ações pacíficas, segundo líderes
políticos e da sociedade civil, analistas e habitantes dos territórios
palestinos ouvidos pela Folha.
Iasser Arafat encontra-se isolado no único prédio em pé dentro
da Muqataa, a sede da liderança
palestina. Todas as construções
em seu redor foram derrubadas,
tal como uma parte considerável
da infra-estrutura palestina. Apesar de o cerco ter elevado a popularidade de Arafat, que alega não
poder promover reformas em um
cenário marcado por toques de
recolher e reocupação, novas lideranças começam a despontar.
"Não é aceitável que haja apenas
a autoridade atual e, do outro lado, o Hamas. Nós estamos totalmente determinados a promover
uma terceira via, a das forças democráticas, contra a autocracia
atual. A terceira alternativa não é
apenas em prol da libertação palestina e do fim da ocupação israelense, mas também para construir uma Palestina democrática,
uma Palestina que seja transparente, com leis legítimas e um governo competente", afirma o médico Mustafa Barghouti, 49. Ele é
o principal líder, na Cisjordânia,
da Iniciativa Nacional Palestina
(Al Mubadara al Wataniyya al Filastiniyya), grupo que defende a
realização de eleições imediatas e
mais transparência na administração palestina, além da fundação de um Estado soberano.
A iniciativa conta com o respaldo de palestinos no exterior, como o filósofo Edward Said, nos
EUA. "Ao contrário do governo
atual, a Iniciativa Nacional Palestina [INP" propõe libertação, não
cooperação com a ocupação israelense. Conta com amplo apoio
na sociedade civil e, como consequência, não inclui nenhum militar ou agente de segurança em seu
quadro e não se ajusta à ocupação
para convir às elites e aos VIPs."
Dez dias atrás, o Conselho Eleitoral Palestino recomendou formalmente a Arafat o adiamento
das eleições, programadas inicialmente para a próxima quarta-feira, alegando dificuldades em promover a votação devido à presença de forças israelenses em cidades reocupadas. Apesar disso,
oposicionistas argumentam que,
sob uma supervisão internacional, a população poderia escolher
quem deve liderá-la.
Segundo Azmi Shuaybi, ex-integrante do Conselho Legislativo
Palestino, "é preciso garantir que
a Palestina se torne independente
como um Estado democrático para evitar que se torne mais uma
ditadura no Oriente Médio".
Vácuo a preencher
A líder feminista Amal Khreishe, 45, integra a INP e diz que,
atualmente, "há duas correntes
principais na política palestina: os
grupos islâmicos e o Fatah. No
meio, há um grande vácuo, e nós
tentamos preencher esse vácuo".
"Acreditamos em eleições e direitos civis. Através desse processo,
vamos nos fortalecer para enfrentar a ocupação israelense. A iniciativa tem três estratégias: 1) pôr
fim à ocupação e obter nossa independência; 2) reformar o sistema palestino e promover a democracia na Palestina; e 3) pôr fim ao
sistema de cantões em vigor na
Palestina. Para isso, requeremos
proteção internacional."
Diretora-geral da Organização
das Trabalhadoras Palestinas, que
integra 89 grupos de mulheres na
Cisjordânia e em Gaza, Khreishe
afirma que "as mulheres estão se
preparando para votar e para
concorrer às eleições a fim de assegurar um Estado democrático".
Para o cientista político palestino Ali Jerbawi, "Israel exige a remoção de Arafat do governo como um golpe de retórica porque
sabe que isso só o fortalece e impede as negociações. Mas não devemos deixar de lutar pela democracia, até porque isso vai dificultar os subterfúgios israelenses".
"Nos últimos 50 anos, nós nos
concentramos na fundação do Estado. Sempre pensávamos na forma, acreditando que depois viria
o conteúdo. Eu, particularmente,
quero uma Palestina democrática. As eleições propiciam um regime democrático, mas não o garantem. Se não houver um programa político, social e econômico claro, ficará mais difícil combater a ocupação. Nós precisamos
de partidos políticos com programas claros. Há instituições e movimentos, mas nós precisamos de
partidos. É verdade que a ocupação atrapalha a democracia, e
muito, mas não podemos impedir
que isso nos proíba de construir a
base para a democracia", analisa.
As críticas à atual administração
também provêm de membros do
governo. Segundo Qaddura Fares, deputado do Fatah (grupo
político de Arafat) no Conselho
Legislativo Palestino, "o Fatah
precisa de uma ampla reformulação, de gente nova". Acusações de
corrupção não atingem apenas a
administração palestina. De fato,
ameaçam a candidatura do premiê de Israel, Ariel Sharon. De
acordo com Yaron Ezrahi, 62,
cientista político israelense e professor da Universidade Hebraica
de Jerusalém, "agora há uma forte
chance de que ele perca a eleição
-não pelo fracasso na área de segurança, apesar da força usada
contra os palestinos, mas devido
ao escândalo de corrupção".
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