São Paulo, quinta-feira, 13 de outubro de 2011 |
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CLÓVIS ROSSI Indignação vira global. E daí?
SÁBADO SERÁ, em tese, o dia mundial da indignação. Pelo menos é o que prometem os diferentes movimentos de indignados que pipocaram neste ano um pouco por toda a parte: 350 atos de protesto em 45 países dos cinco continentes. Pelo número de pessoas que se têm manifestado recentemente na Espanha, no Chile, nos Estados Unidos, na Grécia etc., é razoável imaginar que haverá bom público na maioria desses atos. Acho ótimo. Um mundo que produziu, só nestes anos de crise, 30 milhões de desempregados, a se somarem aos 170 milhões pré-existentes, precisa mesmo de uma bela sacudida, mesmo sem mencionar as outras mazelas. Que sejam os jovens os motores dos protestos se explica exatamente por aí: o desemprego entre jovens até 24 anos bate em 28%, o dobro no conjunto da população. Mas sucesso de público nas manifestações é apenas o começo de um processo, cujo desdobramento é muito difícil de antever. Faço minha a avaliação da revista alemã "Der Spiegel": "Nestes tempos de crise crônica, e depois das intensas experiências da Primavera Árabe, permanece incerto se cenas como estas [a dos protestos nos EUA] representam parte de uma comédia curta ou de um longo drama, um fragmento de um filme velho e familiar ou talvez o princípio de uma revolução americana". Vale para o Ocupe Wall Street, vale para os demais movimentos de indignados. Eu vi esse filme antes, em meia dúzia de cidades do mundo, de Praga a Washington, de Québec a Seattle. Foi nos anos 90, e assustaram tanto o establishment que o movimento foi batizado de "globalifóbico", para tentar carimbá-lo como dinossauros que reagiam ao inevitável. O ponto culminante foi durante conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (Seattle, 1999), em que a moçada conseguiu a proeza de impedir o discurso inaugural a cargo da então secretária de Estado, Madeleine Albright. Não é nada trivial bloquear, em plena terra do "free speech", o discurso da segunda mais importante figura da administração, depois do presidente. Mas vieram os atentados de 2001 e, com eles, a tentativa de carimbar os indignados da época como cúmplices do terrorismo. O movimento refluiu sem deixar marcas realmente relevantes. Dez anos depois, as causas que empurravam os jovens para as ruas só se fizeram mais agudas. Não é apenas a crise ou o desemprego, mas também o arcabouço institucional, magnificamente descrito por Robert Kuttner na mais recente edição de "The American Prospect": "Libere o capital, e você incrementa seu poder político. Enfraqueça o Estado, com privatizações e desregulação, enfraqueça os sindicatos com mercados laborais mais 'flexíveis', e você colhe não apenas mais economia de livre mercado, mas acaba com menos solidariedade cívica e uma política fragmentada. Você remove os contrapesos políticos e institucionais ao poder do 'business' organizado. Nos bons e maus tempos, o capital manda". Os indignados tentam ser esse contrapeso desaparecido. Tomara que consigam, mas é um processo complexo e provavelmente lento para as urgências que a crise dita. crossi@uol.com.br AMANHÃ EM MUNDO Moisés Naím Texto Anterior: Crise econômica: Fed cogitou nova compra de títulos Próximo Texto: Socialista surpreende e cresce na Argentina Índice | Comunicar Erros |
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