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GUERRA SEM LIMITES
Ao atacar muçulmanos ligados a "infiéis", rede terrorista adota estratégia que fracassou no Egito nos anos 90
Al Qaeda pode ter cometido erro em Riad
ADEL DARWISH
DO "INDEPENDENT"
Comentando o ataque terrorista
que matou muitos muçulmanos
há uma semana em Riad, Sherard
Cowper-Coles, o embaixador britânico na Arábia Saudita, descreveu as atrocidades terroristas como ""sem sentido". Para aqueles
que as cometem, porém, elas fazem muito sentido, sim.
Ciente do âmbito da ameaça
com a qual seu país se confronta,
o embaixador saudita em Londres, príncipe Turki al Faisal, disse que a Al Qaeda é "uma seita
maligna", cujos membros obedecem cegamente às fatwas (decretos religiosos) emanadas de seus
líderes, contrariando as normas
islâmicas que proíbem o suicídio
e a matança de civis inocentes.
O objetivo de longo prazo da Al
Qaeda, que divide o mundo em
crentes e infiéis, é controlar os
muçulmanos em todo o mundo,
reintroduzindo o conceito do
"umma" islâmico, ou bloco unido
de centenas de milhões de muçulmanos, surgido no século 7º.
O controle sobre os santuários
mais sagrados do islã, Meca e Medina, é essencial para legitimar
seu chamado, e as imensas reservas petrolíferas da Arábia Saudita
lhe proporcionariam os meios
econômicos para alcançar sua
meta.
Alvejar muçulmanos no Iraque,
também dono de reservas petrolíferas imensas, se encaixa igualmente nessa estratégia: a anarquia
nesse país, raciocina a Al Qaeda,
obrigará a coalizão a desistir de
seu intento, deixando o país nas
mãos de extremistas islâmicos.
Ação contra o governo
Criar uma confusão semelhante
na Arábia faz parte da tática da Al
Qaeda para derrubar o governo
saudita, que acaba de dar início a
um longamente aguardado programa de reformas -parcas pelos padrões ocidentais, mas significativas numa cultura tribal conservadora na qual qualquer mudança democrática encontra resistência por parte de um establishment religioso poderoso que
resiste às tentativas de substituir
as leis dadas por Deus por aquelas
criadas pelo homem.
O presidente Bush, que lançou
um chamado por democracia e
reforma na região, se apressou a
nos recordar a necessidade de travar essa batalha contra o terrorismo desde a mesma trincheira que
a família real saudita.
A tática da Al Qaeda consiste
em espalhar o terror entre os muçulmanos, até obrigá-los à submissão. Assim, alvejar muçulmanos em Riad não foi um ato "sem
sentido", mas um elo numa longa
cadeia.
Os moradores do complexo
Muhaya, que foi atacado com
bombas, têm um estilo de vida internacional que é totalmente rejeitado pelos extremistas. Do lado
de dentro dos muros do complexo, as mulheres dirigem carros, e
amizades entre pessoas de religiões diferentes são formadas durante piqueniques em volta de
piscinas, ocasiões nas quais muçulmanos dividem alimentos
com "infiéis" ocidentais.
O ataque da Al Qaeda envia
uma mensagem complexa: os
muçulmanos de "pouca fé" serão
castigados, e trabalhadores estrangeiros vindos de outros países
muçulmanos farão bem em evitar
a Arábia Saudita, cuja economia
depende em grande medida deles.
Além disso, a Al Qaeda quer fazer com que o governo saudita seja visto como sendo incapaz de
proteger os muçulmanos durante
o Ramadã, quando dezenas de
milhares de fiéis se reúnem em
Meca para visitar seus locais sagrados.
Tática fracassada
O ataque foi uma continuação
da tática fracassada adotada pela
primeira vez no Egito, há mais de
uma década, por terroristas como
Ayman al Zawahiri, o principal
colaborador de Osama bin Laden.
O ataque ao complexo em Riad
lembra o assassinato de qualquer
pessoa que tivesse ligação com turistas no Egito, nos anos 90.
É mais provável, porém, que a
Al Qaeda fracasse em sua tentativa de derrubar o governo saudita.
Depois da morte de mais de 900
pessoas numa onda de terrorismo
que durou cerca de seis anos e culminou com o massacre de Luxor,
em 1997, quando foram mortas
mais de 60 pessoas -em sua
maioria turistas inocentes-, as
forças de segurança egípcias conseguiram virar a mesa contra os
terroristas.
Aproveitando a aversão pública
suscitada pelas atrocidades, a polícia pôde ignorar os direitos civis
na caçada implacável que moveu
contra os extremistas.
Até agora, os esforços feitos pelos serviços de inteligência sauditas para identificar as "células terroristas adormecidas" se chocavam com tabus tribais que proíbem que se delatem pessoas do
mesmo clã.
Entretanto, ao matar mulheres e
crianças -enquanto os homens
de suas famílias estavam rezando
na mesquita -, os terroristas
romperam o código de conduta
que une os muçulmanos tribais.
O ataque anula o estigma ligado
à delação de vizinhos e de pessoas
do mesmo clã que sejam suspeitos de dar apoio a terroristas.
Após os ataques terroristas contra três outros complexos em
maio, a polícia recebeu uma enxurrada de informações fornecidas pelo público (incluindo líderes tribais e religiosos) que a ajudaram a desbaratar grande número de células e deter mais de
600 suspeitos.
Ironicamente, esse êxito provocou pânico entre os terroristas.
Eles vêm transferindo suas células
e seus arsenais de lugar, antes que
os percam. Incapazes, porém, de
atingir alvos bem vigiados, escolheram um alvo fácil de ser atingido, e é justamente esse alvo que
trará resultados opostos aos que
esperam e acabará por ajudar os
EUA na guerra contra o terror.
Com apoio nacional e internacional, a expectativa é que as autoridades sauditas ajam com dureza
para eliminar células "adormecidas" e cortar suas linhas ainda remanescentes de apoio financeiro.
E a continuação de seu programa
de reformas será essencial para
derrotar a estratégia da Al Qaeda,
que visa frear a modernização.
Tradução de Clara Allain
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