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Acuado, Musharraf renuncia à Presidência do Paquistão
Ameaça de impeachment forçou saída de general; sucessão divide governo civil
Sem respaldo dos quartéis e apoio popular, situação do principal aliado regional dos EUA no pós-11 de Setembro tornou-se insustentável
Emilio Morenatti/Associated Press
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Musharraf saúda guarda ao deixar a residência presidencial
DA REDAÇÃO
O general reformado Pervez
Musharraf renunciou ontem à
Presidência do Paquistão, acossado pela ameaça de impeachment após nove anos no cargo.
A saída do líder paquistanês
-que governou como ditador
até o início deste ano, mas que
desde então assistia à erosão de
seus poderes- foi festejada por
opositores de todo o espectro
político e provocou alta das
Bolsas de Karachi e Lahore.
Forjada na oposição a Musharraf, a coalização governista
precisa agora equilibrar divergências internas e apontar o
novo presidente.
O líder do Senado, Mohammad Soomro, assumiu interinamente o cargo. O novo presidente deve ser eleito em até 30
dias pelo Colégio Eleitoral, formado pelo Senado, pela Assembléia Nacional e pelas Câmaras
das quatro Províncias. A escolha acirra tensões latentes no
governo, liderado pelo PPP
(Partido do Povo Paquistanês).
A disputa opõe Asif Ali Zardari -viúvo da ex-premiê Benazir Bhutto e co-presidente
do PPP- a Nawaz Sharif, do
PLM-N (Partido da Liga Muçulmana - facção Nawaz), deposto por Musharraf em 1999.
A Presidência, que tem a prerrogativa de dissolver a Assembléia e é responsável por nomear o comandante das Forças
Armadas, é estratégica para os
partidos, rivais históricos. A superação do impasse pode envolver a reformulação do cargo,
com redução de funções.
Enfraquecido pelo isolamento político, Musharraf despediu-se dos paquistaneses com
um discurso de uma hora pela
TV. Defendeu seu legado e afirmou que deixava o cargo por
colocar o interesse do país acima de "bravatas pessoais". "[Os
governistas] não percebem
que, mesmo que tenham sucesso contra mim, o país sofrerá
danos irreparáveis", disse, em
trajes civis, o general, que concluiu sua fala com um emocionado "viva o Paquistão!".
Musharraf deixa um país menos pobre, que, sob seu governo, superou a crise de 1999 e
manteve uma média de crescimento acima dos 5%. Os indicadores econômicos atuais são,
porém, alarmantes. A inflação
passa dos 20% ao ano, e a previsão de déficit em conta corrente beira 8% do PIB, um recorde
histórico. O país enfrenta apagões energéticos, e a alta do petróleo e dos alimentos deixa entrever perspectivas sombrias.
Derrocada
Principal aliado regional dos
EUA na guerra contra o terror
desde o 11 de Setembro, o ditador viu seu governo ruir em
2007, com o recrudescimento
do terrorismo e a crescente
oposição democrática. Vitorioso no plebiscito de 2002, o governo perdeu o verniz de legalidade em setembro de 2007,
quando Musharraf decretou
estado de sítio, suspendeu a
Constituição e cassou os juízes
da Corte Suprema que contestavam a validade de sua eleição.
Musharraf deixou o Exército
e, nos trajes civis exigidos pela
Constituição, fez-se eleger presidente pelo Colégio Eleitoral,
antes de convocar as eleições
gerais deste ano. Mas a habilidade política que lhe permitiu
controlar a abertura democrática sucumbiu à esmagadora
derrota no pleito de fevereiro.
Mesmo o crucial apoio dos
quartéis se esvaiu nos últimos
meses. O general Ashfaq Pervaiz Kayani, escolhido por
Musharraf para sucedê-lo à
frente das Forças Armadas, não
falou sobre o impeachment.
"Não há hoje condições políticas para apoiar Musharraf",
disse o cientista político Rasul
Bakhsh Rais, da Universidade
de Administração de Lahore,
por telefone à Folha. "A agenda
de mudança que elegeu o governo civil é incompatível com
sua permanência."
Rais afirma que a eleição do
presidente dependerá das negociações na coalizão governista. "O vencedor será o processo
democrático", diz o analista,
que rejeita o suposto favoritismo de Zardari, e crê que um
político de perfil mais conciliador seja escolhido. A indicação
de alguém fora do cúpula partidária pode mitigar as disputas.
Conhecido como "Mr. 10%",
Zardari cumpriu pena de sete
anos por corrupção após o segundo governo da mulher, dissolvido em 1996. Com a morte
de Benazir, o filho do casal, Bilawal, 19, assumiu simbolicamente a presidência do PPP.
Enquanto o rapaz conclui os
estudos em Oxford, o pai exerce o cargo. Ao desembarcar ontem em Karachi, onde participou de reunião do governo, Bilawal disse que o próximo presidente, ainda indefinido, será
do PPP.
(CLARA FAGUNDES)
Com agências internacionais
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