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Karadzic viveu disfarçado como médico e clérigo
Procurado por crimes de guerra, ex-líder sérvio mudou radicalmente aparência
Críticos do governo anterior, nacionalista, vêem leniência com o homem acusado de comandar massacre de 8.000, sumido por 12 anos
DA REDAÇÃO
Radovan Karadzic, 63, preso
anteontem, indiciado pelo genocídio de muçulmanos na
Bósnia e por 12 anos o homem
mais procurado da Europa, viveu sob falsa identidade em
Belgrado, capital da Sérvia,
exercendo a medicina numa
clínica de práticas alternativas
e até fazendo conferências em
associações de moradores.
"Sua nova aparência física
era tão convincente que ele se
dava ao luxo de andar livremente por lugares públicos",
disse Vladimir Vukcevic, procurador sérvio para crimes de
guerra e coordenador da operação de prisão anteontem.
Karadzic deixou crescer o cabelo e a barba e passou a usar
óculos com lentes espessas.
Uma fotografia ontem divulgada demonstrava que "Dragan
Dabic", o nome falso que utilizava, tinha pouco a ver com o
psiquiatra reconvertido nos
anos 90 em chefe dos nacionalistas xenófobos e autoproclamado presidente da República
Sérvia da Bósnia-Hezergóvina.
A Justiça sérvia tentou tomar
depoimento dele ontem pela
manhã -ele permaneceu calado e se recusou a responder as
perguntas- e já determinou
sua extradição para Haia, na
Holanda, onde funciona o Tribunal Penal Internacional para
a ex-Iugoslávia. Ele tem três
dias para apresentar recurso.
Seu advogado, Sveta Vujacic,
disse que lutará até o último
minuto para evitar que ocorra a
extradição.
Exemplo de Milosevic
Mas até os familiares de Karadzic acreditam ser inevitável
seu translado em breve para
Haia. Uma de suas filhas, Sonjia, pediu às autoridades sérvias
que a deixassem em companhia
do pai, antes que ele seja entregue à custódia da ONU, à qual
está ligado o tribunal.
Com a extradição, "o carniceiro de Belgrado" seguirá o caminho de Slobodan Milosevic,
ex-presidente sérvio, enviado a
Haia em 2000 e que morreu em
março de 2006, antes da conclusão de seu processo.
Os detalhes da prisão ainda
não foram revelados. Autoridades sérvias disseram apenas
que o criminoso morava no subúrbio de Nova Belgrado, ocupado pela classe média baixa e
um dos redutos dos nacionalistas de extrema direita. Também afirmaram que o localizaram no início da tarde de segunda, seguindo-o até darem
voz de prisão.
O "Financial Times" afirma
que os serviços sérvios receberam informações de órgãos de
inteligência estrangeira. Belgrado nega. O "New York Times" diz, por sua vez, que policiais há dias invadiram o apartamento da mulher de Karadzic, Ljiljana, apreendendo documentos que foram a seguir
complementados por perquirições em casas de ex-assessores
e simpatizantes do criminoso.
Cumplicidade oficial
O presidente sérvio, Boris
Tadic, e seu recém-empossado
primeiro-ministro, Mirko
Cvetkovic, dispunham-se a
"mostrar serviço" à União Européia, que condicionava a entrega de Radovan Karadzic ao
prosseguimento das negociações para que o pequeno país
dos Bálcãs ingresse no bloco.
A hipótese de o governo anterior ter oficiosamente protegido o criminoso foi levantada
por Nenad Canak, um político
sérvio de esquerda. Ele afirmou
ontem que o ex-premiê Vojislav Kostunica protegia Karadzic por ter as mesmas idéias nacionalistas que ele.
Karadzic não é o único indiciado pelo Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia. Permanece foragido o general Ratko Mladic, número
dois do criminoso agora preso e
também responsável pela morte de 8.000 muçulmanos desarmados em Srebrenica e pelas 12
mil mortes ocorridas durante o
cerco de 44 meses à cidade de
Sarajevo. É igualmente procurado Goran Hadzic, croata responsável pela "limpeza étnica"
no encrave etnicamente sérvio
de Krajina, na Croácia.
Na segunda-feira à noite, o
anúncio de prisão foi festejado
nas ruas de Belgrado por buzinaços. Ontem, no entanto, a polícia dispersou manifestação
favorável a Karadzic, em que
duas centenas de pessoas gritavam seu nome e a palavra "traição". Os manifestantes pertencem a um grupo radical de direita, e entre eles um repórter
da France Presse identificou
Luka Karadzic, irmão do criminoso de guerra.
Com agências internacionais
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