São Paulo, terça-feira, 24 de junho de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA/RELAÇÕES PERIGOSAS

Lobby do álcool atua em campanha de Obama

Ligação põe em xeque defesa do democrata a subsídio da produção do combustível nos EUA em detrimento de importação do Brasil

Segundo "New York Times", assessor e conselheiro do candidato têm cargos e elos com produtores de milho e empresas atuando no setor

Charlie Neibergall-27.jul.07/Associated Press
Obama discursa sobre álcool em Iowa, em 2007; democrata é veemente na defesa dos subsídios à produção nos EUA e nas críticas à importação do produto brasileiro

DANIEL BERGAMASCO
DE NOVA YORK

A posição do candidato democrata à Presidência dos EUA, Barack Obama, de ampliar subsídios para a produção local de álcool de milho foi colocada ontem em xeque com o relato de que dois dos principais assessores de sua campanha têm relações muito próximas com essa indústria.
Reportagem do jornal "The New York Times" citou os nomes do ex-senador Tom Daschle, que viaja constantemente ao lado do candidato, e de Jason Grumet, principal assessor sobre energia e ambiente da campanha de Obama pela Presidência dos Estados Unidos.
Daschle integra a direção de três companhias produtoras de álcool de milho e trabalha para um escritório de advocacia de Washington no qual, segundo o site oficial da empresa, "passa uma quantidade substancial de seu tempo provendo estratégia e aconselhamento político para clientes em energia renovável".
Já Grumet se tornou alvo por ter integrado a Comissão Nacional de Política Energética, ao lado do republicano Bob Dole, que o jornal afirma estar atrelado à empresa alcooleira Archer Daniels Middland.
A reportagem relaciona tais ligações ao apoio de Obama ao álcool de milho e sua resistência a importar o álcool de cana-de-açúcar do Brasil -posição oposta à do republicano John McCain, que defende derrubar tarifas de importação para o produto brasileiro e critica subsídios para o álcool de milho americano, por este ter rendimento quatro vezes menor.
Para David King, analista político da Universidade Harvard, o discurso de Obama em favor do milho vai muito além de seus contatos de bastidores. "Há algo muito mais claro nesse jogo. Iowa, o maior produtor de milho do país, foi o primeiro Estado das prévias partidárias. Obama sabia que, para vencer ali, era preciso deixar muito claro que ele apoiaria essa indústria, porque isso era importante para os moradores. Foi uma boa estratégia: ele venceu aquela eleição e se tornou o vencedor das primárias", disse King à Folha.
Para o analista, no entanto, essa bandeira criará problemas para Obama. "O assunto é muito mais polêmico agora do que na época da prévia em Iowa", diz, referindo-se à preocupação com a alta dos preços dos alimentos, que levanta questionamentos sobre usar comida para fabricar combustível.
Já a reportagem do "Times" cria para o candidato um problema no campo conceitual, já que o democrata se gaba de rejeitar em sua campanha a ajuda de lobistas, que "abastecem", segundo ele, a campanha dos republicanos.
A polêmica chega logo depois de John McCain ter caído em contradição por seus princípios. Ele foi criticado por aplicar dinheiro em fundos integrados por empresas que atuam no Irã -como a Petrobras- enquanto ele próprio costuma defender publicamente boicote a empresas que tenham relação com o país.

Brasil
As discussões de campanha sobre fabricação de biodísel nos Estados Unidos passam constantemente pelo exemplo brasileiro de fabricação do álcool de cana-de-açúcar.
Obama já fez elogios ao combustível produzido no Brasil a partir da cana-de-açúcar, mas fez ressalvas sobre o impacto ambiental das lavouras para a Amazônia. Seguindo a tradição democrata de ser mais restritivo ao livre comércio, disse que não aliviará tarifas para incentivar a importação: "Substituir o petróleo importado por nosso país pelo álcool brasileiro não atende aos nossos interesses nacionais e econômicos [por manter o país dependente em termos energéticos]".
Já McCain voltou ontem a defender o oposto. "Nosso governo paga para subsidiar álcool de milho enquanto cobra tarifas que impedem os consumidores de se beneficiar de outros tipos de álcool, como o do Brasil feito de cana-de-açúcar", disse, detalhando em seguida a experiência brasileira no desenvolvimento do combustível.
Ontem, o republicano afirmou que, se eleito, lançará concurso para premiar com US$ 300 milhões o melhor projeto de bateria de automóvel que aumente o desempenho de carros para economizar energia.


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