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REINO UNIDO
Quem viu a performance de professor alemão em Londres se disse fascinado; para associação médica, foi sensacionalismo
Necropsia pública perturba britânicos
JANE WADELLA
DA ASSOCIATED PRESS, EM LONDRES
Arte, educação, sensacionalismo ou pura e simples ilegalidade?
Ainda não há um o "veredicto"
sobre a primeira necropsia pública realizada no Reino Unido em
mais de 170 anos, conduzida no
último dia 20 por um médico alemão, que cobrou 12 libras (R$
107) por pessoa para quem foi assistir ao evento, realizado numa
galeria de arte de Londres.
Gunther von Hagens desafiou
avisos governamentais de que
não possuía os alvarás necessários, fazendo a autópsia perante
câmeras de TV e 500 pessoas que
lotaram o recinto.
A necropsia teve lugar na mesma galeria londrina onde a exposição "Body Worlds" (mundos
corpóreos), de cadáveres humanos conservados, também de responsabilidade de Von Hagens, já
tinha provocado polêmica.
A polícia informou que está preparando um dossiê sobre o evento e que irá submetê-lo à análise
de promotores. Caberá à Promotoria britânica decidir se formulará acusações criminais.
Dois agentes da Scotland Yard
assistiram à operação. O procedimento foi acompanhado também
por dois professores de anatomia.
A emissora Channel 4 colocou
no ar uma versão editada da necropsia, realizada no corpo de um
alemão de 72 anos. Para Von Hagens, que afirmou querer promover a entrada do público no mundo da medicina, a operação foi
um sucesso. A Associação Médica
Britânica, entretanto, a considerou "degradante e desrespeitosa".
Von Hagens começou avisando
aos presentes -entre os quais
um grande número de jornalistas
e de admiradores dele- que deveriam desviar o olhar se achassem necessário. Em seguida, cortou o peito do cadáver deitado sobre uma maca metálica e abriu o
esterno com as duas mãos.
Nas três horas seguintes, ele reduziu o corpo do homem anônimo -descrito como fumante e
grande consumidor álcool- a
uma pilha de órgãos e a uma outra pilha de pele esvaziada.
Usando avental cirúrgico azul e
o chapéu de feltro preto que é sua
marca registrada, Von Hagens foi
descrevendo o processo ao público. Pouco depois de os órgãos terem sido recolocados dentro do
corpo, Von Hagens deixou o recinto para conceder uma entrevista ao vivo à TV -na qual ele
insistiu que não é artista de circo.
O diretor do Comitê de Ética da
Associação Médica Britânica, Michael Wilkes, disse que esperava
que a experiência não se repetisse.
"Algumas pessoas podem ter
achado valioso como entretenimento, e talvez a operação tenha
tido algum valor educativo também, mas foi sobretudo um evento sensacionalista. Na minha opinião, o aspecto educativo limitado não justifica a maneira degradante e desrespeitosa com que foi
conduzido", disse Wilkes, depois
de assistir ao evento.
O professor afirmou que tinha a
autorização da família do morto e
uma base legal válida para conduzir a necropsia. "A categoria médica às vezes trata o público com
certo desdém e não explica os
procedimentos que são feitos",
disse Van Hagens.
Aula de anatomia
Na maior parte do procedimento a platéia se manteve em silêncio, mas houve várias perguntas.
Uma cópia da tela de Rembrandt
"A Aula de Anatomia do Dr. Nicholas Tulp", de 1632, estava pendurada na parede atrás deles.
Os dois patologistas convidados
concluíram que o morto, que
doara seu corpo para a exposição
antes de morrer, em março, teve
parada cardíaca provocada pelo
fumo e pelo consumo de álcool.
A platéia foi diminuindo ao longo do procedimento, mas as pessoas que ficaram até o final disseram que a acharam informativa.
"Achei fascinante", disse a contadora Louise Cotton, 40.
As necropsias públicas se tornaram populares na Europa no século 16, quando a Igreja Católica
autorizou a dissecação para ajudar na compreensão do "milagre
da Criação". Elas foram proibidas
no Reino Unido em 1832, para
impedir o roubo de corpos.
Tradução de Clara Allain
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