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ARTIGO
Quando os "homens-bomba" são mulheres
JESSICA STERN
ESPECIAL PARA A FOLHA
Em dezembro de 2003, uma
mulher se suicidou matando mais
cinco outras pessoas num atentado a bomba no centro de Moscou.
Antes, no outono, uma mulher-bomba matou 21 outras pessoas
num restaurante lotado em Israel.
Agora, no massacre de Beslam,
aparecem novamente as mulheres. Esses casos e vários outros
ocorridos antes ilustram uma importante fraqueza na nossa estratégia antiterrorista. O perfil oficial
do terrorista típico desenvolvido
pelo Departamento da Segurança
Interna dos EUA para analisar a
concessão de vistos e a permanência de emigrantes no país se
aplica apenas a homens.
Esse perfil foi desenvolvido antes do advento das salas de bate-papo do islamismo recrutarem
militantes para a jihad, antes de a
Guerra do Iraque aumentar o sentimento mundial antiamericano e
antes de as mulheres começarem
a servir como suicidas para as organizações terroristas islâmicas.
De acordo com um programa
iniciado antes de 11 de setembro
de 2001, as concessões de vistos
para pessoas do sexo masculino
entre 16 e 45 anos passam por
uma averiguação especial. No entanto as mulheres, mesmo aquelas de países conhecidos por abrigar terroristas, não estão sujeitas a
esse programa.
O mesmo ocorre com o requerimento que residentes estrangeiros com origem em países como
Paquistão, Iêmen e Arábia Saudita registram no governo federal
-a fiscalização vale só para os
homens. Terroristas procuram
vulnerabilidades nas medidas governamentais do inimigo. Quando detectores de metal foram instalados nos aeroportos, terroristas encontraram outros meios para atacar aviões.
Quando governantes começaram a proteger suas embaixadas
com barreiras de concreto, terroristas adotaram explosivos mais
potentes.
Perfilar exclusivamente homens
e focar a vigilância estritamente
em países famosos por servirem
de bases terroristas deixam significativas brechas que não têm sido
fechadas, a despeito de o FBI reconhecer que a Al Qaeda tem recrutado mulheres e a despeito da
descoberta, na última primavera,
que uma estágiaria do MIT pode
ter servido de suporte logístico
para a Al Qaeda.
Embora mulheres representem
apenas uma fração dos terroristas
espalhados pelo mundo, é ingênuo acreditar que elas não sejam
recrutadas por grupos extremamente violentos.
Mulheres são responsáveis por
um terço dos ataques suicidas
executados pelos Tigres Tâmeis,
em Sri Lanka, e dois terços daqueles efetuados pelo Partido dos
Trabalhadores do Kurdistão. Mulheres têm fundado e liderado
grupos terroristas, seqüestrado
aviões, servido em todas as unidades militares, implodido prédios e
assassinado líderes políticos. O
que há de novo é que mulheres estão participando de ataques em
nome de organizações que promovem as causas islâmicas.
Os grupos islâmicos tradicionalmente são contra o uso de
mártires femininas. Mas, como
resposta ao primeiro ataque de
um mulher-bomba em Israel, em
janeiro de 2002, o sheik Ahmed
Yassin, líder espiritual do Hamas,
morto há dois meses, pareceu esmorecer em sua posição quando
disse que mulheres poderiam
participar de ataques se não existissem homens disponíveis, contanto que elas fossem comandadas por homens.
O xeque Yusuf Qaradawi, decano de estudos islâmicos na Universidade de Qatar e especialista
em islamismo, mexeu com essas
convicções declarando que "a
participação de mulheres em operações de martírio é um dos atos
mais louváveis de adoração".
Uma mulher pode "ir para a jihad
mesmo sem a permissão do marido", afirmou, e pode, se necessário, viajar sem comandantes homens e sem o véu.
As roupas religiosas das mulheres muçulmanas e as normas para
resguardar os corpos poderiam
tornar mais fácil para elas transportarem armas, como foram vários casos durante a Guerra da Argélia. Mulheres ainda despertam
menos medo ou suspeita quando
em situação de violência física.
Como resultado, elas às vezes recebem menos atenção durante
vistorias ou inspeções.
A falta de vigilância sobre as
mulheres ao entrarem nos EUA e
o normalmente sustentado e correto ponto de vista de que mulheres são menos propensas à violência fazem com que a Al Qaeda volte seus olhos às mulheres e outros
recrutas que não se encaixem no
perfil padrão.
Segundo especialistas em inteligência, a Al Qaeda está procurando recrutas ao redor do mundo
nas prisões ocidentais e nas cidades interioranas na América hispânica e entre franceses convertidos ao islã. Por meio de comunicação pela internet está levando
indivíduos a criar suas próprias
células e a promover seus próprios golpes, sem necessariamente serem integrantes de uma organização militante já existente. Esses autônomos também estão recrutando mulheres.
Apesar de agredir o legitimado
padrão nascido da relação com as
liberdades civis, o modelo apela
para burocracias durante o período de guerra porque isto os obriga
a desenvolver um padrão operacional de procedimentos, facilitando e suavizando a pressão sobre aqueles que nos protegeriam.
Isso também facilitou a procura
por terroristas até agora suspeitos. Mas nós estamos lutando
contra um inimigo que continua a
mudar suas táticas, suas propostas de missão, sua etinicidade, sua
nacionalidade e o sexo de seus recrutas. Isso significa que nós precisamos considerar menos essas
variantes como indicadores de
perigo em potencial.
Um instrumento muito mais
poderoso seria uma inteligência
humana maior e melhor que nos
habilitaria a penetrar movimentos armados, monitorar seu modo de recrutamento e prever sua
evolução incluindo o tipo de pessoas que serão recrutadas e, ultimamente esquecido, seu apelo
para a população em geral. Na ausência de tal inteligência, traçar
um perfil pode ajudar, mas apenas se aqueles que policiam as
fronteiras recebem uma constante e regular atualização da situação. Com um inimigo tão multiforme, para manter nosso padrão
operacional vinculado a critérios
como raça e baseado em sexo, é
pôr a segurança do povo americano em risco.
Jessica Stern é especialista em terrorismo da escola de governo Kennedy, Universidade Harvard; é autora de "Terror
em nome de Deus" (ed. Barcarolla)
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