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RESPONSABILIDADE
Falta de incentivos ao empresário contribui para a baixa contratação de ex-detentos
Medo infundado discrimina egresso
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Não há incentivos no Estado de
São Paulo para que as empresas
contratem ex-presidiários. A única motivação é a responsabilidade
social, ainda pouco desenvolvida.
O preconceito é o principal obstáculo no caminho de quem esteve preso. Do outro lado do balcão,
há um empresário com medo,
que não vê motivo para se "arriscar" tendo ex-detentos na equipe.
Dados da Secretaria da Administração Penitenciária mostram,
no entanto, que apenas 10% dos
que são presos cometeram crimes
graves. A estimativa é a de que,
entre os delitos cometidos, 85%
sejam furtos ou roubos.
"Só há incentivos para contratar
detentos. Quando ganha a liberdade, quem estava trabalhando se
torna mais um desempregado",
diz Berenice Giannella, diretora-executiva da Funap (fundação de
amparo ao preso trabalhador).
Entre os egressos atendidos pela
Funap, 65% têm até 30 anos, 60%
têm o ensino médio, e 66% têm
renda mensal de até R$ 6.
Celso Leite Ribeiro, 47, ouve todas as manhãs a "BBC", de Londres. Além de saber inglês -deu
até aulas na prisão-, tem experiência como motorista, domina
datilografia e fez curso de garçom.
Na última sexta, comemorou um
ano de liberdade condicional. Foi
também um ano inteiro sem emprego. "Só consigo bicos", diz.
Pena de morte
Em pesquisa feita pela Fiesp
(Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) no final de
2003 com 543 indústrias do Estado (67% delas de pequeno porte),
8% afirmaram dar oportunidade
de trabalho para ex-detentos.
Uma delas é a firma de Irineu
Garcia, 47, que diz fazer campanha pela causa. "Aos amigos que
me questionam, eu digo: "Você é a
favor da pena de morte? Não? Então sabe que as pessoas têm capacidade de se recuperar". Todos
acabam me dando razão."
Garcia também tem um argumento objetivo: "O índice de furtos na minha empresa era alto.
Quando coloquei os reeducandos, não tive mais problemas. Eles
possuem um código de honra".
O Estado tem cerca 130 mil presos -42,2% dos detentos do
país-, e 95% deles são homens.
A média de ingresso nas penitenciárias é de 5.300 detentos por
mês, e a de saída, de 4.270. Manter
um preso custa, em média, R$ 700
por mês para o Estado.
Controvérsia
Para o Ministério da Justiça, os
Estados podem firmar convênios
para o trabalho de grupos de
egressos sem encargos trabalhistas, como ocorre com os detentos.
Seria um incentivo às empresas.
Especialistas em direito ouvidos
pela Folha, porém, discordam. A
polêmica vem da interpretação
dos artigos 10, 27, 28 e 29 da Lei de
Execução Penal (lei nš 7.210/84).
"Egresso" é o liberado definitivo
(pelo prazo de um ano, a contar
da saída da prisão) ou o liberado
condicional e, segundo os criminalistas, não é mais "preso".
Leila Paiva, coordenadora-geral
de reintegração social do Ministério da Justiça, estende ao egresso
(apenas no caso dos convênios) as
regras do trabalho do preso.
Nem a necessidade de incentivar a contratação de detentos e
egressos é consenso. "Com tanto
desemprego, não faz sentido privilegiar alguém que cometeu um
crime em detrimento de quem
não fez nada", diz o ex-ministro e
professor titular de direito penal
da USP (Universidade de São
Paulo), Miguel Reale Júnior.
Para ele, as condições especiais
são um desvio. "A lei não fala da
privatização do trabalho. A intenção era evitar a relação de emprego entre o preso e o Estado." (BL)
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