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New York Times

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Ossétia do Sul mostra à Crimeia senões da independência

Por OLESYA VARTANYAN e ELLEN BARRY

ATOTSI, Geórgia - Poucos foram os que observaram com tanta atenção as comemorações na Crimeia pela incorporação da península à Rússia quanto os moradores do pequeno enclave montanhoso da Ossétia do Sul, que há cinco anos e meio viveram êxtase semelhante.

Quando a Rússia reconheceu formalmente a independência da região em relação à Geórgia, em 2008, muitos jovens saíram pendurados nas janelas dos carros, agitando bandeiras russas e espirrando champanhe nos transeuntes. Autoridades sonhavam acordadas com a construção de uma economia baseada no turismo, como a de Mônaco ou Andorra.

Mas, hoje em dia, a economia da Ossétia do Sul é inteiramente dependente de recursos orçamentários provenientes da Rússia. O desemprego é elevado, assim como os preços, pois as mercadorias precisam agora ser trazidas da Rússia, através de um túnel que corta a cordilheira do Cáucaso.

O seu sistema político é controlado por elites leais a Moscou. Dezenas de casas danificadas na guerra de 2008 contra a Geórgia nunca foram reparadas. Dina Alborova, que dirige uma ONG na capital da Ossétia do Sul, Tskhinvali, disse que suas esperanças foram todas frustradas.

"Durante o primeiro inverno, ainda pensávamos: 'A guerra mal terminou'", disse. "No segundo inverno, a frustração fincou raízes. Quando o terceiro inverno chegou, tudo ficou claro."

Quando a Rússia invadiu a Geórgia, repelindo um ataque georgiano à Ossétia do Sul e assumindo o controle desta região e da Abkházia, o Kremlin provavelmente não estava pensando em longo prazo. Como na Crimeia, a guerra foi apresentada aos russos como um esforço humanitário e, mais amplamente, como uma contestação ao cerco promovido pelos Estados Unidos, que estavam alinhados com a Geórgia.

A fase posterior ao reconhecimento, porém, provocou uma série de dores de cabeça à Rússia. Economistas alertam repetidamente que a Crimeia causará sérios entraves ao Orçamento da Rússia. Aleksei Malashenko, analista do Carnegie Moscow Center, disse que as autoridades russas "ficarão chocadas" com as dificuldades que enfrentarão para tentar gerir a Crimeia, ressuscitando sua economia, distribuindo dinheiro e influência entre seus grupos étnicos e buscando controlar a corrupção. "Eu acho que, na Rússia, a maior parte da sociedade se esqueceu da Ossétia", disse Malashenko.

Poucos meses depois do reconhecimento russo, tiritando inverno adentro atrás de janelas feitas com folhas de plástico, os sul-ossétios começaram a se perguntar quando os bilhões de rublos da prometida ajuda russa iriam aparecer. A resposta parece ser que grande parte da verba foi roubada: o tribunal federal de contas da Rússia descobriu que, seis meses após o conflito, apenas US$ 1,4 milhão havia sido gasto na reconstrução, como parte de um desembolso de US$ 55 milhões em ajuda prioritária. Até o ano passado, o tribunal estimava que US$ 33 milhões haviam se perdido ou sido usados de forma inadequada.

Embora muitos moradores da Ossétia do Sul tivessem a esperança de serem absorvidos pela Rússia, o Kremlin até agora se recusa a cogitar uma anexação, muito provavelmente porque ela desestabilizaria a turbulenta região russa do Cáucaso, segundo Malashenko. Apesar dos 15 meses de campanha da Rússia, apenas quatro nações seguiram o exemplo de Moscou e reconheceram a Ossétia do Sul como um país independente, e dois deles são ilhas do Pacífico com populações inferiores a 15 mil habitantes.

Moscou também tropeçou em sua tentativa de manter o controle político. Quando o Kremlin tentou engendrar uma vitória do seu candidato presidencial preferido, em 2011 e 2012, isso motivou protestos.

Varvara Pakhomenko, pesquisadora do International Crisis Group, disse que o corrupto processo de reconstrução "criou um estado de espírito muito crítico" com relação à Rússia. "Cada vez mais, você pode ouvir as pessoas dizendo que a Rússia não está realmente interessada no povo da Ossétia do Sul, que ignora as suas opiniões. Há atualmente o temor de que, se a situação política mudar, a Rússia poderá revogar seu reconhecimento ou de alguma forma devolver a Ossétia do Sul para a Geórgia", disse ela. Muitos, segundo a pesquisadora, depositam suas esperanças no sonho de finalmente aderir à Rússia, o que veem como garantia de maiores salários e pensões.

O isolamento da Ossétia do Sul está se aprofundando. Os moradores da aldeia de Atotsi, em território controlado pela Geórgia, observaram recentemente homens vestindo fardas sem identificação construírem parte de uma cerca de arame farpado que se estenderá por 50 km e futuramente envolverá todo o enclave.

Zemfira Plieva, 43, que cresceu dentro de Ossétia do Sul e agora vive bem ao lado dela, antes cruzava o limite várias vezes por semana, para vender hortaliças ou visitar sua irmã, e viu com perplexidade a montagem do espinhoso muro. Quando a mãe dela morreu, há três anos, ela ficou com tanto medo de ser presa que ela não compareceu ao funeral. Quando questionada sobre o que aconteceria se a Ossétia do Sul fosse formalmente anexada pela Rússia, ela começou a chorar.

"Eu nunca mais veria ninguém da minha família", disse ela. "Eu não quero nem pensar nisso."


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