Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria
Premiê indiano lança moda
Por VANESSA FRIEDMAN
Os líderes da Índia talvez tenham entendido melhor do que quaisquer de seus pares internacionais o poder de comunicação da roupa. Mahatma Gandhi adotou o "dhoti" (pano retangular de 4,5 metros de comprimento amarrado em torno da cintura e das pernas, formando uma saia longa). Houve o casaco de Jawaharlal Nehru e os sáris de Indira e Sonia Gandhi, feitos do tradicional "khadi" indiano (pano de algodão cru, seda ou lã tecido à mão). Agora, é a vez de Narendra Modi.
O novo premiê indiano já usou uma peça de vestuário tantas vezes que ela passou a ser conhecida oficialmente por seu nome: é o Modi Kurta, ou "kurta" de Modi, versão da clássica túnica indiana com mangas curtas.
O alfaiate responsável por ela, Bipin Chauhan, da cadeia de butiques Jade Blue, registrou a marca do estilo e o está levando ao Reino Unido, Estados Unidos e Sudeste Asiático. A kurta de Modi tem hashtag próprio no Twitter (#ModiKurta), e há um site de comércio eletrônico (modimania.com) que se dedica a seguir o visual de Modi -isso porque, segundo o site, Modi "virou marca registrada não apenas na Índia, mas em todo o mundo".
Tudo isso revela o êxito de Modi em associar seu estilo pessoal a sua plataforma política, em benefício de ambos. A Modi Kurta não representa um avanço estético extraordinário, mas simboliza um conjunto de valores -e é essa a razão da atração que exerce. "Nunca antes houve uma convergência tão forte entre o que um político indiano representa e as roupas que ele traja", observou Priya Tanna, editora da "Vogue" indiana.
Para ela, a escolha da kurta por Modi ressalta uma imagem cultural "100% indiana".
Ela é democrática -qualquer pessoa pode se vestir assim. Ela apoia a indústria local.
Destaca as origens humildes de Narendra Modi (seu pai era vendedor ambulante de chá). O fato de a kurta que ele traja estar sempre limpa e bem-passada e de com frequência ser colorida (ele já foi visto em kurtas cor de laranja, verde-esmeralda e azul-claro, entre outras cores) forma um contraste nítido com algo que a revista "India Today" descreveu como "a era dos políticos barrigudos e desgrenhados, mascadores de bétele, trajando dhotis amassados e kurtas descoloridos". Sugere uma adesão nítida ao profissionalismo e ao pragmatismo.
As kurtas de Modi são feitos de materiais que incluem o algodão e a seda orgânicos, acompanhando seu pendor declarado por belos relógios (ele possui um Movado) e óculos de sol (Bulgari). É um tipo de estilo indicativo de aspirações, algo que reflete a visão que Modi tem para a Índia e suas indústrias.
Esse fato é sublinhado ainda mais pela história de seu alfaiate, que começou a costurar na calçada diante de confecções e que hoje possui uma rede de lojas e virou celebridade, graças a seu cliente famoso.
Chauhan confidenciou certa vez: "Modi me disse que há três coisas das quais faz questão de cuidar bem: seus olhos, sua voz e suas roupas". Esse tipo de criação confessa de imagem gera um ponto de vulnerabilidade. O líder do partido rival Samajwadi, Mulayam Singh Yadav, acusou Modi de "trocar de kurta 500 vezes por dia" durante a campanha.
Mas a criação de uma espécie de símbolo visual que é largamente reconhecido e -a julgar pelo número de pessoas que começaram a se vestir como Modi- aprovado parece ter valido a pena.
Agora que Modi está no poder, a pergunta é se seu estilo e sua mensagem vão mudar.
Em sua posse, por exemplo, Modi trocou sua kurta de mangas curtas por uma versão de mangas longas, com punho abotoado. O fato suscitou discussões no Twitter sobre se o visual mais formal era ou não um sinal positivo.
A discussão significa que o premiê indiano criou a ideia de que as roupas que veste carregam um sentido que merece ser analisado. Essa talvez seja a tendência que mais valha a pena ser observada.