Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Ensaio - Michael Barbaro

Romney se reinventou após derrota

BOSTON - Quando Mitt Romney encerrou sua primeira tentativa de ser escolhido candidato presidencial republicano, em 2008, declarou que se sentiu roubado da chance de se explicar ao país. Disse que emergiu de sua estreia política nacional como uma caricatura dele próprio, alguém que ele não reconhecia: emocionalmente indiferente, intelectualmente inautêntico, ideologicamente maleável.

Ao longo dos três anos seguintes, ele procurou recriar sua identidade pública com todo o olhar autocrítico, o know-how de marketing e o rigor do consultor corporativo que ele foi no passado.

Quando Willard Mitt Romney, 65, fez seu discurso de aceitação da candidatura, no dia 30 de agosto na convenção do Partido Republicano em Tampa, Flórida, ele deveu o momento em grande medida a seus próprios esforços para persuadir os eleitores a enxergá-lo como ele próprio se vê: um homem de convicções profundas e ideias grandiosas, líder partidário digno de crédito e candidato presidencial inevitável.

Romney fez uma avaliação realista das deficiências de sua campanha de 2008 e passou um ano estudando tudo, desde o código tributário até o jihadismo global. Escreveu um livro apresentando sua visão e seus valores, para combater as acusações de que ele oscila em relação a questões. Atravessou o país para levantar recursos para candidatos.

Romney retornou como candidato muito mais forte que antes: melhor debatedor, gestor mais decisivo, melhor estrategista e político que se atém à sua mensagem de campanha e cujo trunfo principal condiz bem com o que o momento político pede. Mas ele também esbarrou nos limites de sua própria revisão de imagem.

"Este é quem eu sou", disse ele a um publisher quando ofereceu seu livro. "E quero que o livro me revele." Contudo, avesso a expor sua vida privada, ele não ofereceu nenhuma narrativa pessoal que ajudasse as pessoas a sentir que o conhecem realmente.

Seu trabalho exaustivo de campanha entre uma corrida presidencial e outra não ajudou a diminuir seu constrangimento no contato com eleitores. E, apesar de ter se preparado no quesito da política externa, ele ofendeu seus anfitriões em sua primeira viagem ao exterior como provável candidato republicano.

A re-imersão rápida de Romney na política revela muito daquilo que ainda o move: uma confiança duradoura na possibilidade de métodos corporativos serem aplicados na esfera política, um anseio de ser aceito pelo mundo além de sua própria comunidade maior e um ímpeto constante de aprimoramento próprio.

"Romney sentiu que não tinha conseguido criar uma conexão com os eleitores", explicou Peter Matson, seu agente literário. "Para ele, era preciso fazer melhor."

'A mensagem não estava ali'

Em fevereiro de 2008, quando convocou uma dúzia de seus assessores para uma reunião em Boston, Mitt Romney foi intransigente com ele mesmo.

O que tinha funcionado: sua estratégia para levantar dinheiro e atrair delegados. O que não tinha funcionado: sua relativa falta de experiência em política externa e suas posições confusas em relação a questões sociais.

Participantes na reunião descreveram a auto-análise como estranha e impressionante, dizendo que parecia que Romney estava falando de outra pessoa, e não dele próprio. Seu diagnóstico: "a mensagem não estava ali", disseram vários assessores.

Romney argumentou que, com um livro, poderia evitar qualquer ambiguidade. "Poderei escrever o que quero escrever. Poderei dizer o que quero dizer", explicou ele, recordou seu filho Tagg.

Após uma colaboração fracassada com um "ghost writer", Romney digitou todos os capítulos, ele próprio.

Publicado em 2010, seu livro, "No Apology", foi um argumento conservador convincente em favor da preservação da primazia militar dos EUA, sua dianteira econômica no livre mercado e sua independência energética.

Construindo um líder

Em dezembro de 2008, o telefone tocou na casa de Romney no Utah. Era o presidente eleito, Barack Obama.

A esposa de Romney, Ann, tinha acabado de receber o diagnóstico de câncer de mama em fase inicial. Obama transmitiu seus votos de recuperação para ela, dizendo que ele e sua mulher rezariam pela família.

"Ann e eu temos vocês em nossas orações", Romney teria respondido, segundo assessores dele e de Obama. Mas, menos de 90 dias depois de iniciada a nova Presidência, ele atacou Obama num artigo de opinião, acusando-o de "aprofundar e prolongar esta recessão" e avisando que suas políticas arriscavam "acabar com a classe média".

Foi o início de um plano cuidadoso para uma segunda campanha presidencial.

A estratégia de Romney não mudou em relação à de seus tempos na Universidade Harvard, na Bain Capital, como chefe do comitê olímpico de Utah nos Jogos de 2002 e no governo do Massachusetts: ser mais ativo que as pessoas à sua volta. Apenas em 2009 ele compareceu a 53 eventos para causas e candidatos republicanos, fez 44 aparições na televisão, deu 11 entrevistas a jornais e 8 coletivas à imprensa.

Ele se manteve em contato estreito com sua equipe da campanha de 2008 e, o que talvez tenha sido mais crucial, levantou centenas de milhares de dólares junto a amigos, dinheiro que usou para saturar candidatos estaduais e federais com doações para suas campanhas. Entre 2008 e 2011 Romney deu quase US$ 600 mil a 200 representantes e organizações do Partido Republicano em pelo menos 27 Estados.

"Ele trabalhou sem parar", comentou o senador John McCain, candidato republicano à Presidência em 2008, que considerou essa atuação agressiva essencial para o sucesso de Romney.

No verão de 2010, em sua casa em New Hampshire, Romney disse aos doadores de fundos para sua campanha que desta vez queria depender do dinheiro de doadores, não dele próprio.

Sua campanha nas primárias de 2008 tinha custado US$ 107 milhões, uma cifra ironizada como sendo excessiva. Ele continuava fenomenalmente rico. Mas, depois de gastar quase US$ 45 milhões de seu próprio dinheiro em sua primeira candidatura presidencial e outros US$ 12 milhões com uma casa de praia em San Diego, Califórnia, em 2008 o mercado acionário caiu.

Romney perdeu dezenas de milhões de dólares em investimentos, segundo uma pessoa próxima a ele, que descreveu o fato como "um prejuízo enorme".

Hesitações de última hora

Em dezembro de 2010, reunidos na casa de praia, os principais assessores de Romney traçaram planos para uma possível campanha em 2012. Eles visualizaram que o foco maior seria a economia, questão que poderia transcender as divisões republicanas internas. Mas Romney não compartilhou o otimismo deles.

Algumas semanas depois, os Romney se reuniram para votar em família e decidir se Romney seria ou não candidato. Em 2006, a decisão tinha sido unânime, mas dessa vez o entusiasmo tinha desaparecido. "Por que passar por todo o processo apenas para perder novamente?" Romney perguntou, recordou um parente.

Foram dez votos contra dois. Apenas Ann e Tagg foram a favor.

Nos meses seguintes, Romney disse a sua família três vezes que não se candidataria. Mas na primavera de 2011 seus assessores tentaram pela última vez convencê-lo, perguntando a Romney se ele acreditava que seria capaz de resolver os problemas da economia. Ele disse que sim. Não havia mais nada a discutir.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.