São Paulo, segunda-feira, 18 de julho de 2011

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Ação contra Taleban atinge civis afegãos

Por CARLOTTA GALL
CABUL, Afeganistão - As forças de Operações Especiais dos EUA realizaram um número extraordinário de ações noturnas ao longo do último ano, transformando-as em uma de suas ferramentas mais eficazes contra os insurgentes, embora desencadeiem acusações de abuso, ressentimentos entre os afegãos e divergências com o governo.
São atualmente cerca de 300 operações por mês, segundo a Otan e as autoridades afegãs. Centenas de pessoas já morreram e milhares foram detidas nessas ações nos últimos 18 meses.
"Essas incursões noturnas quebraram a espinha dorsal do Taleban", disse Abdul Satar Mirzokhel, ex-vice-governador da província de Helmand. "Seus alvos eram na maioria precisos, visando às pessoas certas nos lugares certos. Se houve erros, foram pouquíssimos."
No entanto, os afegãos continuam se queixando dessas operações, quase invariavelmente realizadas em segredo pelas forças especiais dos EUA, muitas vezes acompanhadas por soldados afegãos. Elas continuam sendo um dos maiores motivos de atritos do presidente Hamid Karzai com Washington.
O general David Petraeus, comandante das forças da coalizão no Afeganistão, defende as operações, mas determinou em maio uma análise sobre as vítimas civis e, mais tarde, sobre a forma como as incursões noturnas são conduzidas.
Mas nem o general Petraeus nem seu sucessor devem reduzir o ritmo das operações. Na verdade, esse recurso -que usa equipes relativamente pequenas das Forças Especiais- deve se tornar mais frequente com a redução do contingente americano em solo afegão.
Os militares e os civis afegãos divergem amplamente em seus relatos sobre as operações. Por exemplo: familiares e um investigador afegão disseram que dois clérigos estavam entre os oito civis mortos numa ação ocorrida em novembro na localidade de Mian (sul).
Muhammad Younus, 60, disse em entrevista que foi tão espancado por soldados americanos que passou 20 dias sem andar. Moradores o teriam retirado num carrinho de mão e o levado na manhã seguinte para ver os corpos de seus dois irmãos, os clérigos Maulavi Abdul Kabir, 72, e Maulavi Abdul Rauf, 65.
A Isaf (força estrangeira sob comando da Otan) confirmou o ataque e as oito mortes, mas o departamento de relações públicas das Operações Especiais qualificou as acusações como "infundadas e sem mérito".
Oficiais militares dizem que acertam seus alvos em 80% das vezes, e que menos de 1% das incursões resultam em vítimas civis. Mas não há como confirmar essas cifras de forma independente.
A ONU examinou operações noturnas realizadas desde o ano passado na região de Kandahar (sul). Moradores disseram que os ataques foram precisos e causaram menos vítimas civis do que antes, segundo Georgette Gagnon, diretora da unidade de direitos humanos da missão da ONU no Afeganistão.
Mas a missão também apontou no seu relatório anual de 2010 que "o uso excessivo da força, maus tratos, mortes e ferimentos a civis e danos a propriedades ocorreram em alguns casos".
O método usado nos ataques, especialmente a invasão de domicílios e de aposentos femininos, é profundamente ofensivo aos afegãos do ponto de vista cultural.
"As pessoas nas aldeias estão mais assustadas com os americanos do que com o Taleban por causa dessas incursões", disse Gul Badshah Majidi, um parlamentar da província de Paktia. Na província de Zabul, o comandante do Exército afegão, general Jamaluddin Sayed, disse que os aldeões estão aderindo a um programa da polícia local não só para manter o Taleban afastado mas também para evitar invasões em suas casas.
A tarefa de reavaliar as operações e as mortes de civis foi entregue ao general John Nicholson, subchefe do Estado-Maior para as operações no Afeganistão. Ele disse que militares passaram a usar soldados afegãos para chamar as pessoas para fora de suas casas e soldados do sexo feminino para que protejam mulheres e crianças.
Não havia nem sinal de tais práticas na operação de novembro em Mian. As forças americanas e afegãs chegaram às 23h e passaram 24 horas ali, detendo todos os homens e espancando vários deles, segundo moradores.
Um assessor do presidente Karzai, Muhammad Siddique Aziz, que dirigiu a investigação afegã sobre o caso, disse que nenhum dos mortos havia sido do Taleban, e que ele travou ásperas discussões com um general americano acerca das suas conclusões.
"Dissemos a ele que as atividades que estão realizando não são nem do interesse deles nem do governo Karzai", relatou. "Por que quem realizou a operação tem que matar pessoas? Por que não se limitaram a prendê-las?"


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