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OMBUDSMAN
Ou vai ou racha
BERNARDO AJZENBERG
O circo montado pelos meios
de comunicação em torno
da renúncia do senador Antonio
Carlos Magalhães tomou conta
da semana.
Satisfação a anseios mórbidos
do público? Concessão inebriada
ao talento midiático do político
baiano? Carência de diversão?
Ingenuidade generalizada expressa na expectativa de que um
discurso fosse detonar bombas
atômicas capazes de estragos superiores a qualquer apagão? Talvez a mistura disso tudo, além
da notícia propriamente dita.
Mas a montanha pariu um rato, como muitos analistas acreditam. E cabe agora à imprensa,
justamente, tentar repor as coisas nos seus devidos lugares.
O fogaréu "carlista" tende a refluir, a perder oxigênio. Não que
ACM esteja politicamente morto, mas, em termos de mídia, até
2002 nada indica que ele fará jus
a muita ribalta. Já foi o bastante.
Tanto o foi que, na mesma semana passada, três casos de extrema gravidade e importância
passaram quase sufocados pelo
tornado midiático "carlista".
EJ, Caribe, Marka
Na edição de terça-feira, a Folha publicava que a Justiça Federal em São Paulo havia negado
no dia anterior pedido do Ministério Público Federal de quebra
de sigilos telefônico, bancário e
fiscal do ex-secretário-geral da
Presidência da República Eduardo Jorge Caldas Pereira.
A mesma reportagem informava que, atendendo a parecer do
senador Bello Parga (PFL-MA),
o Senado arquivou dois pedidos
de informações sobre movimentações financeiras de EJ.
A Folha não publicou, mas, segundo o "Estado de S.Paulo", o
juiz que indeferiu a solicitação
da quebra dos sigilos o fez porque o rastreamento de contas do
Banco Central "não apurou até
o momento qualquer dado que
possa de uma forma ou de outra
incriminar" Eduardo Jorge.
No mesmo dia, na página ao
lado, na Folha, noticiava-se a
condenação, nos EUA, de José
Maria Teixeira Ferraz, um dos
suspeitos de idealizar e comercializar o famoso dossiê Caribe.
Este "affaire", envolvendo nomes dentre os mais elevados (vivos e mortos) da cúpula tucana,
foi retomado na quarta-feira,
véspera da renúncia de ACM,
quando o jornal publicou na capa, abaixo da dobra, a seguinte
chamada: "Para FBI, Motta não
dirigia firma no Caribe".
Dentro, a reportagem informava que, segundo a polícia federal norte-americana, a firma
CH, J & T Inc., com sede nas Bahamas, não tinha o ministro das
Comunicações Sérgio Motta
(morto em 98) como sócio.
Ainda de acordo com o texto,
"o FBI e a PF suspeitam que o
criador tenha falsificado o papel
do dossiê que apontava Motta
como diretor e que o ministro
pode não ter tido nem conexão
indireta com a empresa".
Uma chamada pequena, de
uma coluna, ao pé da Primeira
Página da sexta-feira trazia o seguinte título: "Malan repete que
não sabia de ajuda ao Marka".
Resumia, assim, o que de mais
importante fora dito pelo ministro da Fazenda no dia anterior
em depoimento de quase sete horas na Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado.
Como se recorda, o caso Marka/FonteCindam foi reativado
por uma reportagem da revista
"Veja", há duas semanas, cujo
teor, a rigor, pouco acrescentava
ao que já se sabia antes.
Potencial explosivo
Esses três casos -EJ, dossiê
Caribe e Marka/FonteCindam- têm, cada um separadamente, maior potencial explosivo real do que todas as páginas
de discurso reunidas nos últimos
meses por aquele que pretende
voltar aos palcos por cima, no
ano que vem, usando mais uma
vez a Bahia como trampolim.
Mais do que isso -e eis o que
interessa destacar aqui-, são
casos malparados, que se arrastam já excessivamente e, por isso, estão a merecer solução, para
um lado ou para o outro.
A imprensa tem aqui papel
primordial. Não o de absolver ou
condenar -isso cabe à Justiça- , mas o de esclarecer até o
fim, à custa de investigação e revelação da verdade, sem preconceitos, o que aconteceu.
São três pendências bem concretas, que os leitores contabilizam entre aquelas que os jornais
ou as revistas não souberam ainda resolver. E cobram satisfação.
Em especial as últimas notícias
referentes ao caso EJ e ao dossiê
Caribe, aqui apenas resumidas,
depõem, em tese, a favor dos supostos candidatos ao cadafalso.
Ampliam, assim, o desafio para
os repórteres, ao mesmo tempo
em que, de alguma forma, contribuem para tornar mais próxima a hora do desfecho.
O dossiê Caribe, goste-se ou
não, está por um fio. As supostas
provas de que EJ teria agido de
modo criminoso em diversas
frentes, também.
O mesmo vale até o momento
para o caso Marka/FonteCindam, em especial quanto ao envolvimento supostamente condenatório do ex-diretor do Banco Central Francisco Lopes -e
subordinados seus- nas operações de auxílio às duas pequenas
instituições em janeiro de 99.
Reputações em jogo
O ombudsman não tem a intenção de sugerir a inocência ou
a culpabilidade dos protagonistas desses episódios. Ao contrário: até com certa inquietação,
prega que o jornalismo autenticamente investigativo, mais do
que nunca, não os abandone.
Mas a pergunta é inevitável:
em que momento, com qual autoridade, alguém poderá decretar a necessária solução, ainda
que não simultânea, de pendências tão graves como essas?
O "trombone" de ACM -de
modo paradoxal- mais atrapalhava do que ajudava na resolução de tais eventos. Manipulava
cabeças. Embaralhava cartas,
em tom superficialmente acusador. Queria ter tudo nas mãos.
De certa forma, sua retirada de
cena, conquanto momentânea,
pode significar a suspensão de
alguns obstáculos e indiretamente tornar menos difícil o
aprofundamento das apurações.
Nesse novo momento -no
qual, aliás, muito se tem falado e
escrito contra o "denuncismo"
da imprensa-, os leitores esperam dos jornais algo adicional,
de preferência definitivo, para
esses casos.
Afinal, muitas reputações estão em jogo -não nos enganemos-, sob diversas miras, em
todos os lados do grande balcão.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
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