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OMBUDSMAN
De novo, a falta de equilíbrio
MARCELO BERABA
Daqui a três domingos teremos eleições para as prefeituras. Em São Paulo, as pesquisas indicam, neste momento,
uma disputa indefinida entre
dois candidatos, a prefeita Marta Suplicy (PT) e o ex-ministro
José Serra (PSDB). Atrás dos dois
estão Paulo Maluf (PP) e, distante, Luiza Erundina (PSB).
Desde o dia 17 de agosto, com o
início do horário eleitoral gratuito, a Folha vem ampliando
gradativamente o espaço destinado à cobertura eleitoral. Está
fazendo um bom trabalho?
Vejo dois problemas sérios:
ainda a falta de equilíbrio, aspecto que tratei na coluna de 30
de maio ("A pressão dos leitores
por equilíbrio"), e uma cobertura muito centrada na agenda
dos candidatos e nas suas declarações eleitoreiras. Vou tratar
inicialmente do segundo ponto e
tomar como fonte de análise as
edições mais recentes (de sábado, 4, a sexta, 10).
O período pode ser assim sintetizado: muitas aspas e poucas reportagens. Refiro-me a reportagens que possam ajudar o leitor
a entender o contexto da campanha, a analisar os problemas da
cidade e a julgar as promessas
eleitorais. O jornal, e esse não é
um mal apenas da Folha, acaba
caindo na armadilha dos candidatos, e mantém uma cobertura
à base de declarações bobas e de
trocas de ofensas.
Foi assim na edição do dia 4.
Serra atacou o PT, Maluf atacou
o PT e o PSDB, José Genoino,
presidente do PT, atacou o governador Geraldo Alckmin, e ficou tudo por isso mesmo, porque
nada tinha importância.
Em compensação, o principal
fato da semana, e talvez da campanha, o discurso em que Marta,
na quarta-feira, disse que a vitória de Serra ameaçará a estabilidade política do país, não foi
percebido de imediato pelo jornal. O "discurso do medo", como
passou a ser chamado, mais as
mudanças simultâneas nos discursos de Maluf e Erundina indicam que a campanha toma novos rumos. Quais e por quê? Até
sexta o jornal não tinha decifrado.
Equilíbrio
Mas o problema maior que vejo é o tratamento diferenciado
que o jornal dá para os candidatos. A cobertura da administração Marta Suplicy e de sua candidatura é mais crítica e negativa do que a cobertura de seu
principal adversário, José Serra.
Não acho que o noticiário eleitoral tenha de ter um equilíbrio
perfeito. Aliás, acho isso impossível. A publicação dos fatos não
pode estar subordinada a fórmulas matemáticas. O acompanhamento da eleição e da administração exige vigilância crítica,
porque estão em jogo recursos
públicos e o futuro da cidade.
Mas isso não significa que o jornal não deva buscar o máximo
de equilíbrio. E acho que isso
não vem acontecendo.
Vou recorrer, mais uma vez,
ao levantamento quinzenal feito
pelo Laboratório Doxa (Laboratório de Pesquisas em Comunicação Política e Opinião Pública) do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro). A pesquisa, coordenada
pela professora Alessandra Aldé,
da Uerj (Universidade do Estado
do Rio de Janeiro), pode ser acessada em http://doxa.iuperj.br.
Marta e Serra vêm tendo, na
Folha, espaços semelhantes. O
desequilíbrio aparece quando a
pesquisa classifica as reportagens analisadas como positivas,
negativas ou neutras para a imagem do candidato.
Na última quinzena, o noticiário sobre a candidatura petista
estava bem dividido, mas com
uma predominância de referências desfavoráveis: 36% dos textos analisados eram negativos,
33%, neutros, e 31%, positivos.
Na quinzena anterior, 54% havia sido neutro, 26% positivo e
20% negativo. Havia, portanto,
um maior equilíbrio. Desde que
começou a avaliação, em 29 de
abril, em apenas duas quinzenas
o noticiário sobre Marta foi mais
positivo do que negativo.
A candidatura de Serra teve
uma cobertura, no final das contas, mais favorável. Na última
quinzena, 39% dos textos sobre
ele eram positivos, contra 25% de
negativos e 36% de neutros. Na
semana anterior, os números foram 22% (positivo), 19% (negativo) e 59% (neutro). Mesmo nas
quinzenas em que foram registrados mais reportagens negativas do que positivas, a diferença
foi sempre muito pequena (22%
negativas contra 19% positivas),
com exceção da quinzena entre
22 de julho e 4 de agosto, quando
foram registrados 29% negativas
e 17% positivas.
Rigor crítico
Mas onde a cobertura da Folha
é predominantemente negativa
é em relação à administração
municipal. Das 51 reportagens
publicadas no período e que se
referiam à Marta como prefeita,
61% eram negativas, contra 25%
neutras e 14% positivas.
Quando escrevi a coluna de 30
de maio, Marta tinha 62% das
referências como prefeita negativas. Depois da coluna, por coincidência ou não, esse índice foi
baixando até registrar, em meados de junho, antes do início da
campanha oficial, mais referências positivas (39%) do que negativas (22%). Mas, a partir de
julho, o noticiário voltou a ser esmagadoramente adverso.
A Folha não está sozinha nessa
distorção. O mesmo levantamento feito no "Estado", na última quinzena, mostra um quadro ainda mais desequilibrado.
Marta, como prefeita, tinha 59%
de textos negativos, contra 4%
de positivos. Como candidata,
39% de negativos, contra 24% de
positivos. E Serra, no mesmo período, tinha 48% de textos positivos contra 13% de negativos.
Mas isso não serve de consolo.
Como disse, não acho que o
jornal deva aplicar um modelo
matemático. É da natureza do
jornalismo, e faz parte da tradição da Folha, uma cobertura crítica. O ideal é encontrar o ponto
de equilíbrio que permita ao leitor perceber que o jornal está
sendo igualmente rigoroso com
todos os candidatos e administrações, sem privilégios nem perseguições.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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