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OMBUDSMAN
Advogado do diabo
BERNARDO AJZENBERG
O congresso da Associação
Nacional dos Jornais (ANJ),
realizado nos dias 13 e 14, no Rio,
revelou notícias alvissareiras.
A primeira diz respeito ao número de leitores dos jornais impressos no país.
Segundo estudo feito pela consultoria McKinsey & Co., entre
1996 e 2000 as vendas de jornais
impressos subiram de 6,5 milhões para 7,9 milhões de exemplares por dia.
Informação positiva, considerando-se alguns prognósticos catastrofistas que previam nos
anos 90 um declínio da chamada "circulação", devido, entre
outros motivos, ao crescimento
da internet.
Registre-se que boa parte desse
aumento se deveu ao surgimento de alguns jornais chamados
"populares", cuja participação
no bolo geral passou de 11% para
17% no mesmo período.
A segunda notícia, menos objetiva mas estatisticamente sustentada, diz respeito à credibilidade, item básico para a sobrevivência do jornalismo.
Os jornais impressos, conforme
pesquisa do Datafolha levada ao
encontro, figuram em segundo
lugar na lista de instituições nas
quais a população mais confia.
Com 15%, só perdem para a
Igreja Católica (30%).
O tom adotado pelos títulos
das reportagens sobre o assunto,
na terça-feira, expressam o contentamento:
"Jornal é o veículo com maior
credibilidade" ("O Globo");
"Otimismo marca abertura do
congresso da ANJ" ("O Estado de
S.Paulo");
"Jornais brasileiros têm credibilidade" ("Gazeta Mercantil");
"Igreja e jornais são as instituições nas quais a população mais
confia" (Folha).
Esse regozijo, no entanto, embora compreensível, deve ser visto com cautela e ter como contrapeso algumas constatações.
Primeiro, convenhamos que
15% é muito pouco. Como disse
artigo publicado pelo jornalista
Luiz Garcia (quarta-feira, em
"O Globo"), "reponha-se, portanto, a rolha no champanhe".
Mas não apenas por isso.
Outros dados
Ao entrar no site do Datafolha
(www.datafolha.com.br), é possível acessar mais dados da pesquisa.
Constatam-se, aí, indicadores
preocupantes, alguns não noticiados pela imprensa. E peço licença para assumir, aqui, o papel de advogado do diabo.
Dos leitores diários de jornal,
por exemplo, 63% acham que as
informações publicadas são "um
pouco" confiáveis, contra apenas
33% que as consideram "muito
confiáveis" (veja quadro acima).
Na mesma linha, 43% acham
que os jornais têm apenas "um
pouco de credibilidade", ante
47% (menos da metade, portanto), que neles vêem "muita credibilidade".
É certo que 72% dos leitores
diários acham os jornais ótimos
ou bons, mas 57% consideram
que eles trazem notícias ruins
em excesso (32% concordando
totalmente, 25% concordando
em parte com essa avaliação).
O sensacionalismo é, de longe,
com 37%, o principal problema
apontado como crítica por leitores descontentes, seguido pela
falta de profundidade nas matérias (23%).
Outro dado importante como
alerta: para 46% do conjunto de
leitores, os jornais precisam sofrer, sim, algum tipo de controle
externo. 52% se posicionaram
pela "liberdade total". Considerando-se a margem de erro da
pesquisa, pela amostra global
(três pontos percentuais), há um
surpreendente empate técnico.
Nesse quesito, aliás, os números se aproximam do mercado
norte-americano. Recente levantamento citado por Janet Kirtley,
professora de direito e ética dos
meios de comunicação, da Universidade de Minnesota, em encontro na sexta em São Paulo,
mostra que para 43% da população a imprensa, lá, tem liberdade demais.
Segundo lugar no ranking de
credibilidade? Certo, mas com
apenas 15% (metade do campeão). Aumento de circulação?
OK, mas de apenas 5% em quatro anos.
Em vez de ressaltar os dados
positivos, o recomendável é que
os jornais (e os jornalistas) atentem para o que revelam as outras indicações da mesma pesquisa: falta muito para que a imprensa conquiste, aos olhos do
leitor, a bela imagem que ela
costuma enxergar no espelho.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
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