|
Próximo Texto | Índice
OMBUDSMAN
Os erros da Folha
MARCELO BERABA
A Folha cometeu um erro
grave na edição de segunda-feira, dia 20, do seu caderno
especial Eleições 2004. A capa
que começou a imprimir tratava
das inserções de propagandas
dos governos federal (PT) e estadual (PSDB) nas emissoras de
TV.
A idéia da reportagem era pertinente. Há uma sensação geral
de que os governos (federal, estaduais e municipais) multiplicam
suas campanhas publicitárias
nos períodos eleitorais.
Sob o pretexto de informar ou
de prestar serviços, os governos
anunciam sempre e muito, mais
ainda na época das eleição. E é
difícil os cidadãos terem acesso
ao total desses gastos e aos seus
detalhes (quanto custou cada
campanha publicitária, quanto
foi destinado para cada veículo
de comunicação, quanto foi gasto por mês etc).
Esses números deveriam ser
públicos e de fácil acesso para
qualquer um. Como isso não
ocorre, a imprensa tem de tentar
obtê-los por outros caminhos.
O primeiro erro
Foi o que fez a reportagem da
Folha quando recorreu a uma
empresa especializada em levantamentos de anúncios veiculados
nas emissoras de TV, a Controle
da Concorrência.
A idéia do jornal era boa. Com
o relatório dos anúncios institucionais pagos pelos governos federal (PT) e estadual (PSDB) e
da propaganda eleitoral gratuita, seria possível verificar se os
governos estão anunciando muito ou pouco e se estão anunciando mais no período eleitoral do
que antes.
Um levantamento como esse
seria importante em qualquer cidade. Mais ainda em São Paulo,
onde as duas principais candidaturas, as de José Serra e de Marta
Suplicy, têm o apoio, respectivamente, do governador Geraldo
Alckmin e do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva.
Com base nos dados fornecidos, a Folha concluiu que o governo Alckmin e o governo Lula
vinham anunciando mais no período eleitoral do que no anterior. O Estado teria dobrado as
inserções publicitárias; as do governo federal teriam crescido
50%.
A Folha, obedecendo procedimento padrão, foi ouvir os dois
governos antes de publicar a reportagem. A Secretaria de Comunicação do governo federal
disse "não haver ligação eleitoral
entre as propagandas institucionais em São Paulo e a campanha". E o governo estadual informou que os números da reportagem estavam "errados para mais" e "superestimam a
quantidade de comerciais veiculados".
Esse alerta acendeu o sinal
amarelo na Redação. Procurada, a empresa teria confirmado
os dados. A Redação notou, então, que os dados não continham uma campanha do governo federal, a de amamentação. A
empresa incluiu a campanha.
O jornal começou então a rodar, na noite de domingo, com
as reportagens editadas na capa
do caderno Eleições 2004: "Alckmin dobra propaganda oficial
na TV após início de horário
eleitoral" e "Anúncios federais
tiveram aumento de 50% em
emissoras".
Nesse meio tempo, o jornal fez
nova checagem e chegou à conclusão que os números relativos
ao período pré-campanha (1º de
julho a 16 de agosto), base para a
comparação com os do período
eleitoral (17 de agosto a 7 de setembro), estavam "subestimados". Ou seja, foi detectado o erro apontado pela Comunicação
do Estado.
Aí, já era tarde. Já tinham sido
rodados cerca de 42 mil exemplares, destinados a leitores de
fora da cidade de São Paulo.
O primeiro erro do jornal foi
não ter dado crédito à advertência do governo estadual e insistido na publicação da reportagem
antes de uma verificação mais
rigorosa. Para os leitores, não teria feito a menor diferença o jornal levar mais um dia para checar e analisar melhor os números e publicá-los, se estivessem
certos. O jornal se precipitou.
O segundo erro
Confirmado o erro, a atitude
do jornal foi correta: suspendeu
imediatamente a rodagem e retirou a reportagem das páginas.
No dia seguinte, seguiu com os
procedimentos apropriados e fez
publicar, na edição de terça,
uma carta do governo do Estado,
uma nota na seção "Erramos"
da página A3 e uma reportagem
("Folha publicou dados errados
sobre publicidade"), no caderno
Eleições 2004.
Acho que, além destas medidas, a Folha deveria ter publicado um texto na primeira página
da Edição Nacional avisando
seus leitores do erro. Isso porque,
na véspera, a reportagem tinha
tido destaque na capa do jornal.
O procedimento de dar às correção realce semelhante aos erros
cometidos é raro na imprensa
brasileira. Deveria ser adotado
com mais freqüência porque demonstra para o leitor a disposição de corrigir e acertar, o que
eleva a credibilidade do jornal.
O terceiro erro
O terceiro erro o jornal ainda
não cometeu, mas o fará se, traumatizado pelo ocorrido, desistir
de investigar os gastos públicos
com publicidade. É do interesse
dos eleitores saber quanto os governos queimam com anúncios
neste período de disputa pelas
prefeituras. O secretário de Redação da Folha Vinicius Torres
Freire informou que "o jornal
ainda está empenhado em obter
tais informações".
Próximo Texto: O erro da precipitação Índice
Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Marcelo Beraba/ombudsman,
ou pelo fax (011) 224-3895.
Endereço eletrônico: ombudsman@uol.com.br. |
Contatos telefônicos:
ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira. |
|