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Pedagogia tributária
Lei que prevê discriminação de impostos em notas fiscais precisa ser sancionada logo por Dilma, para concretizar um direito do contribuinte
Em boa hora a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que estabelece a obrigação de discriminar em notas fiscais o valor de tributos recolhidos. O projeto, já aprovado no Senado, seguiu para sanção da presidente Dilma Rousseff.
Resultado de campanha que obteve mais de 1,5 milhão de assinaturas, a norma regulamenta o artigo 150 da Constituição, que já determinava esse forma de esclarecimento dos consumidores.
No total, deverão ser relacionados nas notas nove tributos: ICMS, estadual; ISS, municipal; e os federais IPI, IOF, IR, CSLL, PIS/Pasep, Cofins e Cide.
A mera profusão de siglas e caracteres -e são só nove entre dezenas de impostos- já dá ideia de como é artificiosa e complicada a tributação. Com os valores explicitados, muitos começariam a se dar conta de que ela é também excessiva e de que sua expansão serve mais ao propósito de financiar os perdulários gastos públicos do que a tornar o país melhor.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, assinala a dificuldade técnica de explicitar impostos que não são cobrados diretamente sobre o produto. É o caso do IR e da CSLL, que incidem sobre o lucro final das empresas e só podem ser calculados a posteriori.
A ponderação é pertinente, mas não serve para justificar um veto abrangente à lei. O próprio texto permite flexibilidade, ao exigir que o valor exposto seja aproximado e ao prever que o cálculo do IR possa ser apurado como se incidisse sobre o lucro presumido, uma analogia para simplificar as contas.
Para lançar o valor na nota emitida por outras empresas, em qualquer regime, bastaria "presumir" uma margem dada de lucro em cada ato de venda e, com base nisso, calcular o valor aproximado que deve constar na nota fiscal.
Os demais impostos podem ser calculados mais facilmente, não havendo empecilho algum para exibi-los no recibo fiscal. Estimativas do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário indicam que o ônus não raro supera 50% do valor final dos produtos.
"Nenhuma tributação sem representação" foi o mote dos pioneiros das 13 colônias americanas que se rebelaram contra o domínio da monarquia britânica. No Brasil de hoje, uma democracia, não se trata de exigir direitos políticos, mas algo mais básico: o direito de saber quanto o governo recolhe do fruto do trabalho de todos, parâmetro objetivo para aquilatar o que oferece de volta à sociedade.
O princípio desrespeitado, porém, é o mesmo: impede-se o cidadão de deliberar sobre os impostos -no caso brasileiro, mantendo-o na ignorância sobre seus meandros e extensão.
A presidente Dilma Rousseff tem a obrigação de demonstrar que não teme essa transparência pedagógica e de sancionar a lei apenas com os vetos imprescindíveis para pô-la em prática o quanto antes.