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Vingança verde
A imagem parece feita de encomenda para agradar aos ambientalistas radicais, pelo que concentra de simbologia e de esperança. Uma árvore rompe o concreto do elevado Costa e Silva, em São Paulo.
Uma apenas? Não; há 20 delas, e se mostram bem pujantes. Suas raízes infiltram-se nas rachaduras de um dos mais eloquentes exemplos da insensibilidade urbanística que orientou, desde sempre, o crescimento paulistano.
Inaugurado em 1971, o Minhocão impôs a uma tradicional área da cidade as consequências de uma insuportável desvalorização econômica, arquitetônica e humana. Edifícios passaram a ter uma via expressa a poucos metros de suas janelas, produzindo fuligem e decibéis num ritmo infatigável.
Debaixo da obra -cujo papel de ligação entre as regiões Leste e Oeste da cidade não pode ser desprezado-, deu-se o previsível em qualquer metrópole subdesenvolvida: mendigos encontram abrigo em meio ao lixo, ao comércio degradado e aos congestionamentos, que não deixaram de acontecer.
É mais um sintoma do esgotamento dos ideais urbanísticos que priorizavam o automóvel em detrimento do transporte público. Fruto de uma concepção datada, o Minhocão não terá lugar numa cidade mais humana. Mas a questão não é só demoli-lo, mas fazê-lo segundo um planejamento viável.
Há menos de dois anos o então prefeito Gilberto Kassab anunciou uma proposta de demolição da via, com a construção de vias férreas subterrâneas, a um custo considerável e um prazo muito dilatado.
Não foi o primeiro nem será o último plano a aumentar a pilha de factoides dos burocratas urbanos.
As árvores, enquanto isso, foram aprofundando sua crítica silenciosa à situação. Alimentando-se dos dejetos de pombos, dos sedimentos das chuvas e dos restos da presença humana, as figueiras desenvolvem raízes que são capazes de mover toneladas com o tempo.
Sua presença não remete apenas a uma expectativa utópica -a de um jardim suspenso, quem sabe aceitando o percurso de algum monotrilho silencioso no lugar dos carros privilegiados pela mentalidade paulistana. O crescimento das árvores é também um sinal de grave descuido administrativo, pois indica a presença de pontos de infiltração na estrutura da obra.
Crescem com isso os riscos de desabamento -a exemplo do que ocorreu na ponte dos Remédios, na marginal Tietê, em 2011.
Solução imediata: herbicidas para impedir esse perigo. Só resta esperar que, a médio prazo, as árvores possam ter sua revanche.