São Paulo, domingo, 03 de outubro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Tarefa do eleitor

GERALDO MAJELLA AGNELO

As eleições municipais nos oferecem a oportunidade de participar da escolha dos primeiros mandatários das prefeituras e das Câmaras Municipais do país. Trezentos e oitenta mil candidatos e candidatas deverão disputar, nas eleições de hoje, as 72 mil vagas para os cargos nos 5.562 municípios.
Acompanhamos com interesse o nosso povo na expectativa de eleger prefeitos e vereadores capazes de se doarem ao bem comum, como reais servidores da população, fazendo da política uma forma sublime de caridade. Só assim construiremos um poder local no horizonte que nos propomos para o nosso país -uma sociedade democrática, justa e solidária.
As eleições são um momento oportuno para tomarmos posição diante da situação que vive o povo. O Brasil, apesar de ser uma das maiores economias do mundo, está numa das piores colocações nos índices de desenvolvimento humano, com grandes populações vivendo na miséria. A existência de milhões de empobrecidos é a negação radical da ordem democrática. A situação em que vivem os pobres é critério para medir a bondade, a justiça, a moralidade, enfim, a efetivação da ordem democrática. Os pobres são os juízes da vida democrática de uma nação.
O voto popular sempre foi e será o melhor caminho para a construção de alternativas para um país justo e democrático e para o veto a políticas públicas distantes do bem comum. O nosso povo alimenta sempre, em cada eleição, a esperança de um passo à frente na política em nível municipal. Daí a importância de ampliar, sempre mais, o apelo à participação na construção de políticas públicas voltadas às suas necessidades. Só um povo que participa se fará co-responsável pelo mandato do seu candidato eleito.
É de fundamental importância os mandatários do povo terem como aliados os cidadãos e cidadãs conscientes nos movimentos sociais, como viveiros permanentes de consciência da cidadania e verdadeiras escolas de formação da ação política.
No município, o cidadão aprende a fazer política, participa da vida partidária e adquire o verdadeiro espírito de serviço ao bem comum. No município, as pessoas convivem e se conhecem, sentem concretamente os problemas e discutem as soluções. Diante dos olhos vigilantes do povo, vereadores e prefeitos mostram o que são e são cobrados pelo que fazem ou deixam de fazer.


A situação em que vivem os pobres é critério para medir a efetivação da ordem democrática

As eleições municipais podem e devem sufragar candidatos competentes e dispostos a perseguir o desafio de superar a exclusão social e as desigualdades humanas, a partir das demandas locais. Estimulamos que a escolha do candidato se faça a partir do seu programa, do respeito ao pluralismo cultural e religioso, do comportamento ético, do compromisso com a justiça e a partir de qualidades como honestidade, competência, liderança, transparência, vontade de servir ao bem comum. Conheça a história de vida do candidato para que seu voto comece a mudar sua própria história de vida!
A missão do eleitor consciente não pára, no entanto, no dia das eleições. Urge atenção para a atuação dos eleitos, cooperando com eles, mas exigindo coerência política, cobrando deles fidelidade aos compromissos eleitorais assumidos com o povo. Eleja alguém para representá-lo, não para substituí-lo. Os conselhos paritários são um grande meio para a concretização desse intento. Cabe ao eleitor e à eleitora acompanhar os eleitos no exercício do seu mandato.Geralmente as pessoas nem se lembram mais em quem votaram.
As eleições são, também, uma grande oportunidade e um chamado insistente a continuarmos avançando no combate à corrupção eleitoral -um problema extremamente enraizado na nossa cultura política. Infelizmente, muitos eleitores e candidatos ainda acham natural a troca de seu voto por algum favor. A lei 9.840, contra a corrupção eleitoral, uma lei de iniciativa popular, tem sido um instrumento valioso para inibir os que corrompem e os que se deixam corromper no processo eleitoral.
É hora de darmos um passo adiante na moralidade pública, aprimorando a cultura democrática, embora saibamos que é preciso percorrer um longo caminho para instalarmos uma nova consciência política.
O compromisso com a constante superação da distorção da compra de votos, começando das bases da nossa sociedade, poderá construir novas práticas políticas e nova cultura política -iluminadas pelo lema-chave de toda essa mobilização: "Voto não tem preço, tem conseqüências".
A eleição será o momento oportuno para continuar a luta e semear a esperança que eleva o ânimo daqueles que acreditam nas grandes mudanças para o país e se empenham por um Brasil justo e solidário.
Vote consciente! Exerça sua cidadania! Que o espírito de Deus ilumine os eleitores e os candidatos eleitos no cumprimento do seu dever!

Dom Geraldo Majella Agnelo, 70, doutor em teologia com especialização em liturgia, cardeal-arcebispo de Salvador (BA) e primaz do Brasil, é o presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

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