São Paulo, quinta-feira, 07 de agosto de 2008

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Editoriais

Menos pobres

Surgimento de "nova classe média" põe em foco desafios e prioridades antes relegados a segundo plano no país

AS RECENTES estatísticas sobre a redução das disparidades de renda no Brasil representam uma excelente novidade e respondem a uma série de medidas corretas tomadas na gestão econômica desde o Plano Real.
Pela primeira vez, a classe média passa a ser maioria no país, conforme estimativas da Fundação Getúlio Vargas. As famílias com renda mensal entre R$ 1.064 e R$ 4.591 correspondem hoje a 51,9% da população, confirmando tendência de crescimento que remonta a 2004.
Também são impactantes os números do Ipea que apontam diminuição na porcentagem de pobres nas seis principais regiões metropolitanas. Em 2003, 32,2% da população tinha renda familiar inferior a meio salário mínimo. Com a retomada do crescimento, o índice voltou a cair, recuperou o patamar obtido em meados da década passada com a estabilização da moeda, chegou a 23,5% em 2006 e, tudo indica, continuou em queda.
Ainda que bem menores do que os verificados em países como a China, e ainda que expostos às variações do cenário internacional, os índices de crescimento da economia brasileira autorizam uma sensação de otimismo que, desde a década de 1980, estava ausente da maioria das avaliações a respeito do futuro.
Alguns comentários entretanto podem ser feitos, não para arrefecer um clima de confiança recuperado a duras penas, mas sim no sentido de apontar desafios e prioridades que se colocam, uma vez confirmadas as tendências da estatística.
Em primeiro lugar, avanços na mobilidade social não mais se fazem por meio da fórmula que marcou a história brasileira no passado: um processo maciço de urbanização e o papel direto do Estado na industrialização.
A mera migração para a cidade grande já constituía ascensão social para quem mal sobrevivia nas zonas agrárias miseráveis. A indústria teve, no século 20, um papel de geração de empregos que, mais e mais, hoje é representado pelo setor de serviços. O protecionismo estatal e os postos de trabalho que abria hoje dão lugar a um ambiente muito mais competitivo e a um espírito empresarial mais aguerrido do que o classicamente associado às camadas médias tradicionais.
O pólo dinâmico representado pela "nova classe média" da sociedade coloca em destaque, hoje, demandas diferentes para todo o sistema.
A desigualdade social, mais do que nunca, não é um problema idêntico ao da desigualdade de renda. Disparidades no acesso à educação, à cultura, aos serviços urbanos e à qualidade de vida se tornam fatores relevantes na persistência de divisões profundas na sociedade brasileira e ainda dificultam a formação de uma cultura de cidadania e identidade democrática vigorosa no país. O desafio continua; parece mais possível, felizmente, enfrentá-lo a partir de agora.


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