São Paulo, domingo, 09 de maio de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Oposição: um comportamento positivo BORIS FAUSTO
A transição do governo Fernando Henrique para o de Lula parece
um fato distante, embora tenha ocorrido há apenas 16 meses. Mas foram meses marcados por ruidosos episódios,
por violências sociais com reflexos na
política, por enormes decepções para
quem as tinha, em maior ou menor
grau. Nem por isso a transição foi um
acontecimento circunstancial.
Voltemos ao Brasil, partindo dos personagens centrais. Como se sabe, o ex-presidente Fernando Henrique guardou uma espécie de quarentena política, evitando pronunciamentos críticos com relação ao novo governo, até o momento em que a quarentena, em vez de salutar, corria o risco de ser tomada como omissão. Não é demais apontar, nesse sentido, que o sonho do ministro José Dirceu, aconselhando Fernando Henrique a cuidar só dos netos e de sua biblioteca, esfumou-se no ar, como tantos outros sonhos do PT e do governo. Deixemos, porém, palavras impensadas e lembremos algo mais sério, qual seja, o fato de que nossa transição de governo teve não apenas significado em si mesma, como apontou um caminho para o comportamento da oposição -especificamente o PSDB- nos meses seguintes. É fato público e notório que as trapalhadas do atual governo têm origem no seio do próprio aparelho governamental e no PT, como até mesmo um aturdido presidente tem dito a portas fechadas, ou não tão fechadas. O PSDB, afora uma ou outra voz mais estridente -é uma questão de temperamento-, tem tido uma atitude de crítica responsável diante dos desacertos do governo e das suspeitas que pesam sobre alguns de seus integrantes. Para ficar em um exemplo recente, foram os governadores do PSDB as principais figuras que conseguiram conter governadores aliados do governo (aliados?) e outros mais, na sua tentativa de quebrar as regras da responsabilidade fiscal, em reunião com o presidente que se anunciava problemática. Entre outras coisas, o PSDB vem mostrando, na oposição, coerência com suas posições básicas quando no governo, uma virtude rara em nosso mundo político e no de outros países. Vem mostrando ainda que o interesse nacional se sobrepõe a ataques irresponsáveis, os quais foram a marca registrada do PT e aliados nos oito anos de mandato de Fernando Henrique. É problemático afirmar que esse comportamento vai se traduzir em ganhos eleitorais imediatos. Mas, certamente, representa uma contribuição relevante para nossa maturidade democrática, que, como a transição do passado, é também lenta, gradual e insegura -embora progrida. Boris Fausto, historiador, é presidente do Conselho Acadêmico do Grupo de Conjuntura Internacional, da USP. É autor de, entre outras obras, "A Revolução de 30" (Companhia das Letras). Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Boutros Boutros-Ghali: Rumo à democracia global? Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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