São Paulo, domingo, 16 de março de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Vamos falar sobre drogas GIOVANNI QUAGLIA
A cada ano, as Nações Unidas escolhem um tema para marcar o Dia
Internacional contra o Abuso de Drogas, que é comemorado em 26 de junho.
O tema de 2003, bastante apropriado à
realidade brasileira, é "Vamos falar sobre drogas". O objetivo é envolver a sociedade no debate sobre a questão das
drogas, e este artigo é uma colaboração
com essa iniciativa.
Outro aspecto importante é a concentração de renda derivada do tráfico de drogas. Em 2001, o consumo de heroína e cocaína nos Estados Unidos e na Europa movimentou cerca de US$ 80 bilhões. Desse total, apenas 1% ficou com os agricultores envolvidos nas plantações da matéria-prima dessas duas drogas nos países em desenvolvimento (Afeganistão, Bolívia, Colômbia e Peru, por exemplo). Os demais 99% foram parar nas mãos dos traficantes. A maior parte dos US$ 3,8 bilhões que retornaram aos países produtores não contribuiu para a economia local, pois os gastos dos traficantes estão concentrados em produtos importados. Essa análise ainda não está disponível para o Brasil, mas o mercado doméstico de drogas ilícitas gera alguns bilhões de dólares para os narcotraficantes, que devem grande parte de seu lucro aos consumidores com alto poder aquisitivo. Não pretendendo esgotar o assunto aqui, mas é preciso dizer que, para reduzir o mercado de drogas ilícitas, a estratégia brasileira deve ser bem balanceada entre a prevenção e a repressão. Medidas preventivas são importantes para influenciar os jovens a não se envolverem com o consumo de drogas ilícitas, prover serviços de qualidade para usuários que querem deixar o hábito ou reduzir os riscos associados ao uso dessas substâncias e facilitar a reinserção dessa população na família e na comunidade para reduzir a reincidência. Nessa questão, a pior e mais custosa política pública é deixar à própria sorte e sem nenhuma ajuda aqueles que desenvolveram problemas com drogas. Nas duas últimas décadas, a Europa tem investido em serviços públicos de qualidade. Nos Estados Unidos, o orçamento da Estratégia Nacional para o Controle de Drogas cresce consistentemente e os serviços de prevenção e de tratamento do abuso de drogas receberão cerca de US$ 5,2 bilhões em 2003. Isso representa 47% do orçamento destinado ao controle de drogas naquele país. As medidas repressivas são igualmente importantes e tradicionalmente reconhecidas. Mas, no campo da prevenção, muitos anos foram necessários para se chegar à conclusão de que os investimentos nessa área dão retorno e reduzem o mercado das drogas ilícitas. A fim de melhorar os indicadores de drogas e crime, a sociedade brasileira deve apoiar as políticas internacionais já ratificadas pelo país. Como o governo britânico observa, as convenções da ONU oferecem espaço suficiente para que os países ajam dentro de necessidades específicas. Para serem eficazes, os governos federal, estaduais e municipais devem incluir a prevenção ao crime e à droga como um tema transversal nos seus planos de trabalho, uma vez que esse problema afeta toda a sociedade. Com a união de esforços entre o governo e a sociedade civil, um progresso considerável poderá ser feito, mesmo com investimentos moderados. Giovanni Quaglia, 52, é o representante regional do Unodc (Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crimes) para o Brasil e o Cone Sul. Foi chefe de Operações na sede do Unodc em Viena e representante do mesmo escritório no Paquistão, Afeganistão, Irã, Brasil e Bolívia. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: April Palmerlee: As mulheres das Américas e a democracia Índice |
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