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INFECÇÃO NOS MERCADOS
A crise do capitalismo global
deixou de ser um tema restrito
a intelectuais de esquerda. É uma
realidade que transparece há meses e
se torna especialmente intensa com a
onda de desconfiança que predomina entre os investidores no mercado
de capitais dos Estados Unidos. O
impacto financeiro dos ataques de 11
de setembro se empalidece diante
dos efeitos do abalo em corporações
globais de setores estratégicos, como telecomunicações.
O sistema financeiro global acompanha a tendência. A retração dos investidores é generalizada e coloca em
risco o próprio valor internacional
do dólar. É verdade que já não ocorrem episódios de colapso de bancos.
Mas o sistema financeiro mundial já
passou por várias ondas de ajuste, levando a uma concentração maior e a
uma fragilização dos sistemas financeiros de países mais pobres. Em alguns casos, como na Argentina,
houve desnacionalização completa e
por fim uma quebra pura e simples
do sistema e da moeda.
Japão, União Européia e Estados
Unidos convergiram para uma trajetória de crescimento baixo e até de
estagnação. A expectativa de que os
EUA e a economia mundial iniciariam etapa de recuperação no segundo semestre arrefeceu. A economia
americana perdeu US$ 11,5 trilhões
nos últimos 26 meses.
O índice Dow Jones, da Bolsa de
Valores de Nova York, despencou
4,75% na última sexta-feira. Já está
em nível mais baixo que o registrado
no dia dos atentados terroristas do
ano passado. As chances de sobrevivência das economias em desenvolvimento se estreitam. No Brasil, um
conjunto de medidas que normalmente estabilizariam o mercado de
câmbio tem sido pouco eficiente.
As guerras protecionistas entre
EUA e União Européia criam ainda
mais barreiras às exportações dos
países em desenvolvimento.
As instituições multilaterais há
muito são incapazes de regular economias e mercados. FMI, Banco
Mundial, Organização Mundial do
Comércio e outras têm dado sucessivas e embaraçosas demonstrações
de inépcia ou de impotência.
No centro da crise de confiança está a ruína, mais uma vez, do mito ultraliberal de que os capitais são capazes de se auto-regular em direção a
um sistema mais equilibrado e com
taxas mais altas de crescimento.
Há mais de 60 anos, um pensador
inglês alertou para a tendência no limite autodestrutiva dos capitais sem
amarras, após vivenciar a débâcle do
capitalismo industrial que se seguiu
à crise de 1929. John M. Keynes acusava a existência de "espíritos animais" no mundo dos capitais livres.
O presidente do Fed, banco central
norte-americano, não estava muito
distante disso ao citar, na semana
passada, a "ganância infecciosa" que
teria tomado conta dos mercados de
capitais liberalizados e globalizados.
Nesse contexto de impasse e incerteza, ainda não se sabe de onde virá o
antídoto ou ao menos, como prefere o presidente Fernando Henrique
Cardoso, um "calmante".
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