São Paulo, terça-feira, 25 de outubro de 2011 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES CANDIDO MENDES A caprichosa rua do povo
A onda contra a corrupção não chegou às ruas como prevista pelos melhores arautos da nossa consciência cívica. Nada de comum com a Marcha dos Cem Mil contra a ditadura ou com o "Fora Collor". À exceção de Brasília, foram poucos milhares, em São Paulo, e números diminutos, no Rio. Perguntar-se-ia, de saída, qual, de fato, o impacto de uma mobilização que passou, toda, à internet. Em que termos ainda são limitadas as suas linhas de penetração social, ou até onde a rua continua a pedir lideranças frontais e convocatórias diretas e sumárias de protesto, em contraste com o clamor difuso dos últimos dias? Mas o inquietante, de fato, desse balanço é atentar-se ao quanto, nestas insatisfações de agora, levantam-se clamores claramente reacionários, mostrando, até mesmo, o pior do status quo. Diante do Brasil das faxinas, aí está o propósito declarado de alguns próximos encontros, de somar à luta contra a corrupção a campanha contra o voto obrigatório, na demonstração mais clara de como incomoda, hoje, ao velho Brasil, o povo de Lula, e a virada, de vez, das maiorias eleitorais pela mudança. Não há, também, que atribuir o fracasso à dita falta de preparo de uma disciplina da mobilização, por grupos e subgrupos e palavras de ordem. Ocupa a rua um inconsciente coletivo, tão anônimo quanto incontrolável, a explodir, afinal. É a maturidade de uma consciência nacional que avança, muitas vezes, subterraneamente, no seio do processo social. E nele não são outras as marcas, afinal, de uma modernidade em sintonia crescente com a visão do Estado desligado, de vez, da "cosa nostra" e suscetível de dar conta da ordem social, do bem-estar e da justiça, no imo de todas as esperanças populares. Nestes dias, por outro lado, desponta o novo amadurecimento da democracia, que é o de ficar nas ruas, como querem os indignados da praça da Catalunha, em Barcelona, ou da praça Porta do Sol, em Madri. É a volta à ágora ateniense, a pôr em causa o cansaço do princípio da representação política, ainda dos novos reptos aos direitos humanos da complexidade do mal e das dificuldades de apurar o verdadeiro dissenso nas sociedades mediáticas. O que deparamos é um novo plantão de vigília cívica, que começa a planejar o seu revezamento -como se vê na praça de Madri-, ciente de que o seu ineditismo passa, mas que a praça dos indignados quer perdurar como um contraponto dos congressos de todas as apatias, em tempos de crise das esquerdas e de perplexidade com a nova globalização. A praça Porta do Sol acicata a consciência coletiva. Mas esse avanço -como entre nós, agora, nestas "viradas de página" da corrupção- recusa os oportunismos moralistas do status quo. O povo sabe quando desce à rua, e de vez. CANDIDO MENDES é membro do Conselho das Nações Unidas para a Aliança das Civilizações, da Academia Brasileira de Letras e da Comissão de Justiça e Paz. Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Luiz Eduardo Soares: Tranquila e infalível como Bruce Lee Próximo Texto: Painel do Leitor Índice | Comunicar Erros |
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