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Câmara devolve mandatos aos cassados pela ditadura
Em sessão solene, Congresso faz homenagem aos 173 deputados cassados
Dos 28 políticos ainda vivos, 18 foram à Câmara receber broches e diplomas em ato de reparação simbólica
Em uma sessão solene, o Congresso Nacional devolveu ontem simbolicamente os mandatos dos 173 deputados federais cassados por motivos políticos durante a ditadura militar (1964-1985).
Somente 28 deles ainda estão vivos hoje, dos quais 18 puderam ir ontem a Brasília para a cerimônia.
O tempo entre a cassação e a reparação foi longo, mas o retorno ao plenário da Câmara dos Deputados foi visto por eles próprios como um sentimento de "reparação de uma injustiça".
As cassações ocorreram em diferentes momentos do regime e por diferentes razões, com base em atos do Executivo (como o Ato Institucional de 1964 e o Ato Institucional nº 5 de 1968).
CERIMÔNIA
A cerimônia de ontem começou às 16h10 e seguiu até o início da noite com a entrega dos diplomas e dos broches que identificam os deputados federais.
A festa seguiu com um coquetel no qual foi lançado o livro "Parlamento Mutilado", feito por consultores legislativos, com a ficha de cada um dos parlamentares perseguidos pela ditadura.
Aos 88 anos, o ex-deputado Ney Ortiz Borges, à época no PTB do Rio Grande do Sul, foi um dos homenageados. Emocionado, ele contou como foi cassado em abril de 1964, um dos primeiros após o golpe, e pulou o muro da Embaixada da Iugoslávia para não ser preso.
FUGA
"Morei seis meses na embaixada. Depois consegui seguir para aquele país. Passei também pela Itália, pela Inglaterra, pela França e pela Alemanha", disse à Folha.
Ortiz conseguiu voltar para o Brasil em 1971, após ser sustentado com a ajuda financeira de familiares no exílio, em um navio de carga que desembarcou em Santos.
Viveu escondido na casa de um amigo em Petrópolis até conseguir voltar a advogar, sua profissão, no Rio de Janeiro.
"Não me quiseram de volta na política após a Anistia [aprovada em 1979]. Acharam que eu já estava velho demais", afirmou.
Uma das idealizadoras da cerimônia, a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) agradeceu aos 18 deputados cassados que participaram da solenidade e aos representantes dos políticos perseguidos que estiveram na Câmara.
"É um passar a limpo daquela história, de encaminhar o processo de reparação e justiça às vítimas, sem revanchismo, para as gerações futuras", disse.
Neste ano, a presidente Dilma Rousseff, ela própria presa e torturada durante a ditadura, nomeou a Comissão da Verdade, colegiado com a função de investigar e, ao fim de dois anos, narrar as violações aos direitos humanos cometidos pelo Estado. A comissão, porém, não tem capacidade de punir ninguém.
A comissão já está realizando reuniões para investigar as pessoas que colaboram com o regime e levantar quem morreu em confronto com a repressão.