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Terapia celular reverte diabetes tipo 1
Estudo que segue há mais de quatro anos 23 pacientes mostra que tratamento com células-tronco livrou 15 deles da insulina
Pesquisa da USP de Ribeirão revela que pâncreas voltou a funcionar; autor avalia que ainda não é possível falar em cura de diabéticos
GABRIELA CUPANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um estudo brasileiro inédito
revela que o pâncreas de diabéticos tipo 1 está voltando a funcionar após o transplante de células-tronco do próprio paciente, livrando-o da necessidade
de insulina.
Os resultados da pesquisa,
que acompanha 23 voluntários
há mais de quatro anos, estão
publicados na edição de hoje do
Jama (jornal da Associação
Médica Americana).
Os autores constataram, pela
primeira vez no mundo, que os
níveis do peptídeo-C, uma espécie de marcador do funcionamento das células produtoras
de insulina, aumentaram nos
pacientes submetidos à terapia.
Essa substância é um dos resíduos da produção do hormônio pelas células beta do pâncreas. Ou seja, quanto maiores
suas taxas, maior a produção de
insulina e menor o risco de
complicações associadas ao
diabetes, como amputações.
"O nível dele não só deixou
de cair como aumentou", comemora o endocrinologista
Carlos Eduardo Barra Couri, da
USP de Ribeirão Preto, e um
dos autores do estudo. "Isso
significa que o pâncreas está
voltando a funcionar", explica
ele. "Esses pacientes produzem
mais insulina do que quando
chegaram até nós."
A maioria dos voluntários
deixou de usar hormônio sintético há mais de três anos, em
média, com bom controle da
glicemia. "Temos pacientes livres há quatro anos e oito meses, com excelente qualidade
de vida, sem picos de hipoglicemia", diz Couri.
Oito deles precisaram voltar
a tomar o hormônio sintético,
mas em doses muito baixas.
"Por isso não dá para afirmar
que os benefícios sejam permanentes", avalia o imunologista
Júlio Voltarelli, um dos líderes
do estudo.
Mas mesmo nesses pacientes
os níveis do peptídeo-C estão
aumentados, mostrando que o
pâncreas está funcionando melhor também nessas pessoas,
apesar de não produzir todo o
hormônio de que necessitam.
"Eles provavelmente terão
uma melhor evolução da doença", acredita Júlio Voltarelli.
O diabetes tipo 1 é uma doença autoimune, em que o próprio sistema de defesa do corpo
passa a atacar o pâncreas. A terapia com células-tronco, ao
que parece, consegue combater
essa falha imunológica, mas
não recupera as áreas destruídas da glândula. Daí a necessidade de aplicá-la em pessoas
recém-diagnosticadas.
Medicamento
Outro resultado inédito
apontado pelos autores foi o
efeito da droga sitagliptina, indicada para diabéticos tipo 2,
em dois dos pacientes que voltaram a precisar da insulina.
Com dois meses de medicação,
eles ficaram livres do hormônio
sintético. A droga estimula a secreção de insulina pelo organismo. Hoje tais pacientes controlam a glicemia tomando esse
remédio uma vez ao dia.
Em 2007, com a publicação
dos primeiros dados do transplante de célula-tronco, o trabalho recebeu duras críticas da
comunidade científica internacional, que atribuiu os bons resultados a um período conhecido como lua-de-mel, em que
mudanças na dieta e exercícios,
aliados ao acompanhamento
médico, seriam os responsáveis
pelos benefícios.
"Hoje não há dúvidas de que
não se trata de lua-de-mel", diz
Couri, lembrando que o primeiro artigo sobre a pesquisa
publicado no Jama levou um
ano para ser aceito -a aceitação desse último levou dois meses. Para Voltarelli, ainda não
se pode falar em cura do diabetes. "Mas talvez estejamos trilhando o caminho para isso."
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