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CRÍTICA
O clube dos exibicionistas-mirins
BIA ABRAMO
KELLY KEY, Sandy & Júnior e Michael Jackson: o que
essa gente toda tem em comum? No últimos dois
meses, os quatro têm aparecido na televisão mais do
que o habitual e, ainda por cima, tendo que se haver
com seus fantasmas sexuais. Criados diante das câmeras de
TV, os quatro são vítimas da volúpia voyeurística de gente
grande que se encanta com crianças mimetizando a sexualidade e o comportamento adultos.
Kelly Key, moça de 19 anos que na vida real engravidou na
adolescência, despontou para o público cantando "Baba,
Baby", uma canção onde ela chama de otário o adulto que teve a decência (ou talvez a prudência)
de recusar seus apelos sexuais precoces. De algumas semanas para cá, ela
protagoniza a campanha do Ministério
da Saúde incentivando o uso da camisinha como forma de prevenção à Aids
-e o fato de ser ela a escolhida para esse papel foi objeto de uma certa indignação por parte de ONGs e educadores. Como mãe adolescente, ou seja, alguém que evidentemente já fez sexo
sem camisinha, ela não teria credibilidade para incentivar o uso do preservativo e, como mulher que vive de sua imagem de gostosa, ela
não seria moralmente adequada como modelo para garotas
entre 13 e 24 anos (alvo principal da campanha deste ano do
Ministério da Saúde).
A propaganda veiculada na televisão, entretanto, é bem-feita: Kelly Key entra em uma farmácia e, enquanto os balconistas ficam especulando se a moça vai comprar batom ou xampu para a "boquinha" ou o "cabelinho", ela pergunta: "Onde é
que vocês colocam a camisinha?". Pegos de surpresa pela
franqueza da moça e pelo duplo sentido da pergunta, os balconistas ficam com cara de tontos. O que se vê, na verdade, é
uma menina com autonomia para se proteger e sem pudores
para falar em voz alta sobre preservativo para uma platéia
masculina.
Os irmãos milionários Sandy & Júnior, cuja imagem pública foi moldada, com bastante ajuda da TV, bem ao gosto da
hipocrisia moralista e machista da classe média, também estrelam uma campanha pelo uso da camisinha, esta da ONG
Ação da Cidadania. Sandy e Júnior são "profissionais" do
"showbiz" praticamente desde que deixaram as fraldas e, a
partir da adolescência, passaram a encarnar os filhos adolescentes que toda família conservadora queria ter: a moça é sexualmente atraente, mas afirma ser virgem e quer continuar
assim até o casamento; do rapaz diz-se que deixou de ser virgem na idade certa para não ser confundido com um bundão
ou para que não pesassem dúvidas sobre sua preferência sexual. Em filmes separados, com linguagem "realista" (leia-se
preto-e-branco) e em forma de "depoimento", os dois recitam a ladainha consciente sobre a importância do uso da camisinha, aquela
que todo adolescente de classe média
sabe repetir na frente dos adultos, mas
que poucos praticam de verdade.
E, finalmente, Michael Jackson, patrono e membro-fundador do clube
dos exibicionistas-mirins, aos 44 anos
ainda tem que se haver com sua sexualidade estagnada na terra do nunca de
uma infância que não houve. Nos últimos tempos, ele tem mostrado sinais
de que andou perdendo alguns parafusos da cabeça, além de quase toda a cartilagem do nariz. Primeiro, deixou que um ex-diretor de filmes pornô fizesse um
"documentário" (que vai ao ar hoje no canal de TV por assinatura Sony, às 21h) sobre sua vida, onde Jackson, candidamente, admite gostar de dormir com meninos. Depois, fingindo-se assustado com a repercussão dessa e de outras revelações (como o fato de ter, na prática, comprado seus "filhos",
da mesma forma que comprou o chimpanzé Bubbles), ele
prepara um contra-documentário, em que mostra a "sua"
versão, reiterando seu amor pelas criancinhas de todo o mundo, blá-blá. Patético, Michael Jackson não tem nenhuma sexualidade real para se contrapor à que lhe atribuem.
Exibicionistas infantis e sedutores precoces, essa gente cresce meio vítima de si mesma e quase nunca consegue se livrar
das armadilhas impostas por essa condição para sempre ambígua entre as sexualidades infantil e adulta. E a TV adora um
"freak show".
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