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JANIO DE FREITAS
Em companhia das armas
Antes que se torne fato consumado, desses a que o Congresso acaba se curvando por comodismo geral ou interesses individuais, é conveniente que a opinião pública e os parlamentares
atentem para o acordo de assistência militar que o Brasil, até
com certa contrariedade das Forças Armadas, está sendo levado a
firmar com os Estados Unidos.
Assinado pelo governo brasileiro sem divulgação, mas com a validade pendente de aprovação do
Congresso, como todo acordo internacional, o protocolo prevê a
doação de material bélico retirado do uso pelas Forças Armadas
americanas, seja em razão do
desgaste ou de superação tecnológica. Não será, porém, a solução
para a carência brasileira de
equipamentos militares, porque o
problema atual das Forças Armadas é falta de verbas e a manutenção das doações tem custo elevado, não sendo material novo.
Nem por isso está aí o inconveniente mais inquietante.
Acordo militar é sempre uma
forma de acordo político, por menos explícito que seja o sentido
subjacente. O Brasil mesmo tem
comprovação histórica da natureza dúplice desses acordos. Não
poderia ser mais puro o Acordo
Militar Brasil-Estados Unidos, no
seu propósito declarado de proporcionar material bélico doado,
instrução e supervisão para o seu
uso. O ensino técnico oferecido
pelos instrutores presentes nos
quartéis brasileiros revelou-se um
revestimento: seu recheio foi a
doutrinação paulatina, no convívio normal do dia-a-dia, para ouvidos predispostos a absorver os
conceitos de um instrutor das
Forças Armadas dos Estados Unidos.
Até hoje os militares brasileiros
procuram reencontrar-se, necessitados de uma doutrina militar
própria; da identificação do papel
que devem ter as forças armadas
de países por desenvolver-se; e,
ainda, de despojar-se dos extremismos incutidos na mentalidade militar. A tão radical deformação dos conceitos deve-se muito
do atraso nas reformas sociais
ainda devidas ao país e por tanto
tempo vistas só pela ótica primária da Guerra Fria segundo o
Pentágono. Também as precipitações de 64 devem bastante aos
instrutores americanos e a outros
doutrinadores militares mandados para cá, como o golpista internacional e general Vernon
Walters.
As influências diretas dos militares americanos foram afastadas
pela Presidência do general Geisel. O presidente Jimmy Carter invertera a posição dos Estados
Unidos em relação às ditaduras
latino-americanas e à violação
dos direitos humanos. A suspensão do acordo militar foi, para
efeitos públicos, a resposta de Geisel às pressões do governo Carter.
Resposta inócua para os Estados
Unidos, mas, se bem que não tivesse tal propósito, permitiu que
mais tarde começasse algum arejamento na área militar.
Na atualidade, o Pentágono e o
Departamento de Estado querem
os militares brasileiros envolvidos
em operações contra o narcotráfico, não só no Brasil, mas também
nas vizinhanças. Os Estados Unidos já planejam e constroem a
Grande América, a América da
Alca, a América integrada -com
a óbvia hierarquia.
O novo acordo proposto pelos
Estados Unidos e aceito por Fernando Henrique Cardoso inclui a
volta de inspetores americanos
aos quartéis brasileiros. Armas,
doadas ou não, são portadoras de
doutrinas e políticas.
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