São Paulo, sábado, 06 de outubro de 2007

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Central da PM não gravou reação aos ataques do PCC

Aparelho estava em conserto desde 26 de abril do ano passado, alega a polícia

A gravação é usada para esclarecer as circunstâncias de ações consideradas suspeitas; Promotoria diz que irá investigar caso

DA REPORTAGEM LOCAL

A investigação sobre as mortes de civis durante a reação policial aos ataques do PCC (Primeiro Comando da Capital), no ano passado, perdeu uma de suas principais provas. Contrariando procedimentos normais de segurança, o Copom (centro de operações da Polícia) de São Paulo afirma não ter gravado as comunicações entre o órgão e os carros dos policiais acionados nos supostos confrontos.
A Polícia Militar diz que houve uma pane no aparelho que grava as comunicações do Copom na capital paulista e nega sabotagem. As conversas nem chegaram a ser gravadas, segundo a corporação. O Ministério Público classifica o episódio como "esdrúxulo" e promete investigar o caso.
Gravadores do Copom registram as ligações para o telefone 190 e as comunicações, por rádio, entre o órgão e os carros da PM acionados para atender as ocorrências policiais.
O registro dos diálogos é utilizado para esclarecer as circunstâncias de ações consideradas suspeitas. Em alguns casos, por exemplo, a gravação traz até sons dos tiros durante a ação policial, o que ajuda a avaliar a atuação dos policiais nos confrontos.
Segundo a PM, no entanto, houve interrupção no serviço entre os dias 26 de abril e 11 de julho do ano passado, conforme antecipou ontem o jornal "O Estado de S. Paulo". O equipamento, que era obsoleto, teria sido encaminhado para conserto, que durou 76 dias.

72 horas
A ausência da gravação justamente em um período em que policiais são suspeitos de forjar situações de confrontos e matar civis foi descoberta em um processo criminal que apura a morte de dois adolescentes -Leandro Carmo da Silva, 15, e Laion Alcioles Soares Cancela, 17- pela Força Tática da PM.
A falha só foi confirmada depois que a Justiça determinou 72 horas para o secretário estadual da Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, apresentar as gravações do Copom envolvendo a morte dos dois jovens.
Um dia depois de um oficial de Justiça ter entregue a notificação na secretaria, o coronel Ailton Araújo Brandão, comandante do Policiamento da Capital, encaminhou ofício à 3ª Vara do Júri de São Paulo relatando a falha. Segundo o ofício, o equipamento de gravação "parou de funcionar por problemas de desgaste natural".
A primeira onda de violência envolvendo ataques do PCC, seguida de uma reação policial, ocorreu entre os dias 12 e 19 de maio do ano passado. No total, 493 pessoas foram assassinadas no Estado, 92 delas em supostos confrontos com a PM.
"As gravações são importantes para esclarecer essas circunstâncias. Para apontar irregularidade, mas também para confirmar a legalidade da ação. Agora, vamos ter de buscar outras provas", afirmou o promotor Augusto Eduardo de Souza Rossini, que atua no processo da morte dos adolescentes. "A ausência da gravação pelo Copom pode prejudicar até mesmo a defesa dos policiais."
Segundo o assessor especial de direitos humanos da Procuradoria Geral de Justiça, Carlos Cardoso, o episódio é "esdrúxulo" e precisa ser investigado. "Por que ficaram tanto tempo sem gravar essas conversas? Isso precisa ser explicado."
Cardoso afirma que a Procuradoria vai abrir uma investigação para saber por que o Copom ficou sem o sistema de gravação durante tanto tempo.

Passado
"Esse problema [ausência de gravação] deveria ter sido resolvido o mais breve possível. Temos de saber por que não foi", afirmou o ouvidor da polícia paulista, Antonio Funari.
Segundo ele, dos quatro PMs envolvidos na ação que provocou a morte dois jovens, três tinham participado de outras ações com morte. Um deles já tinha se envolvido em outros seis casos de suposto confronto. "Isso é muito para um só policial", disse Funari.
Os PMs afirmam que os adolescentes trafegavam em um carro roubado e reagiram. Familiares afirmam que os jovens não tinham envolvimento com o crime e não sabiam dirigir.


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