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Pela primeira vez, Brasil tem voz ativa no G8
A partir de quarta-feira, na Alemanha, país falará sobre a produção de álcool, tema em que é mundialmente reconhecido
Assunto principal da cúpula será a busca por fontes de energia que sejam menos prejudiciais ao ambiente e venham de países seguros
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
Pela primeira vez nos 31 anos
de história do G7 (transformado em G8 a partir de 1998), o
Brasil não é um ausente ou mero convidado de pedra, que nada tem a dizer sobre o tema
principal.
A partir do dia 6, em Heiligendamm, pequeno balneário
alemão no Báltico, sede do G8
de 2007, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá falar
-e ser ouvido com interesse-
sobre biocombustíveis, na medida em que o assunto principal
da cúpula passou a ser a busca
por fontes de energia que sejam
menos prejudiciais ao ambiente e, ao mesmo tempo, provenham de fornecedores seguros.
O Brasil não faz parte do G8,
composto por Estados Unidos,
Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Canadá e Rússia. Mas Lula foi convidado a
participar na forma que a imaginativa retórica diplomática
batizou de G8+5 (os cinco são,
além do Brasil, a China, o México, a Índia e a África do Sul).
Qual a diferença entre as 31
cúpulas anteriores e a de Heiligendamm? Simples: antes, os
temas passavam a anos-luz da
possibilidade de interferência
do Brasil. Tratava-se, acima de
tudo, de discutir como ajeitar a
economia mundial de acordo
com os humores e interesses
dos sete grandes. A incorporação da Rússia não mudou quase
nada o espírito do grupo, tanto
que os russos, nos primeiros
anos após a sua entrada, ficaram confinados ao dia final,
quando já estava encerrado o
debate de temas econômicos.
Mesmo neste ano, o projeto
inicial da Alemanha, presidente de turno do G8, previa debater a transparência dos mercados financeiros mundiais, a redução dos desequilíbrios macroeconômicos, a liberdade de
investimento e as conseqüências sociais da globalização.
O que mudou tudo foi o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, que prevê uma catástrofe
global se não forem adotadas
medidas urgentes para combater o chamado efeito estufa, os
gases que causam o aquecimento global.
A mudança de agenda foi honestamente admitida por
Bernd Pfaffenbach, o "sherpa"
alemão, em entrevista recente
ao jornal britânico "Financial
Times" ("sherpa" é a palavra
que se usa em cúpulas globais
para designar os funcionários
que fazem o trabalho preparatório, como os guias que conduzem os alpinistas no Himalaia).
"Os líderes não podem falar
durante um dia e meio apenas
sobre como alcançar um crescimento econômico mais equilibrado. Energia e mudança climática são tão importantes
quanto a economia", afirmou.
O Brasil não tem peso para
reequilibrar a economia mundial, como é óbvio. Mas, em matéria de combate ao aquecimento global, pode, sim, falar
daquilo em que é especialista
mundialmente reconhecido: a
produção de álcool, combustível limpo e que não procede, ao
menos por enquanto, de países
sujeitos a tormentas políticas,
como a Venezuela e os países
árabes, grandes fornecedores
de petróleo. Ou mesmo a Rússia, cujo gás tem sido usado para o que a União Européia considera uma chantagem.
Desta vez, ao contrário do
que vinha sendo a norma até
recentemente, o Brasil não é o
vilão em matéria ambiental.
Claro que ainda há críticas ao
desmatamento da Amazônia,
claro que há vários especialistas que começam a questionar
o álcool como combustível quase milagroso e limpo.
Mas as críticas e suspeitas sobre o álcool, ao menos o brasileiro, vindo da cana-de-açúcar,
dizem respeito a um suposto
futuro em que a cultura para
produzir o combustível deslocaria a plantação de alimentos e
aumentaria o desmatamento.
São mais palpáveis os benefícios imediatos, ante a urgência
colocada ao planeta pelo relatório sobre mudança climática.
Tanto que o presidente norte-americano George Walker
Bush já assinou com o Brasil
um memorando de entendimento em torno do álcool, e a
União Européia convidou Lula
para falar sobre biocombustíveis em conferência especial no
dia 6 de julho, em Bruxelas.
Por isso, o chanceler Celso
Amorim anuncia "uma posição
muito combativa, não defensiva" durante o G8, no qual Lula
intervirá apenas no último dia.
Até sobre a Amazônia o Brasil agora sai da defesa para, segundo Amorim, vender a tese
de que "a Amazônia será uma
grande vítima da mudança climática, correndo o risco de virar uma savana em 70 anos".
Tudo somado, o presidente
Lula estará à vontade para dizer que os biocombustíveis são
uma importante contribuição
para mudar o padrão de consumo energético, reduzindo os
elementos mais poluidores.
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