|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Programas sociais não
bastam para superar pobreza
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
Uma das iniciativas mais
celebradas nesses primeiros tempos de gestão petista é a
de colocar o combate à pobreza
em primeiro plano, até incluindo metas sociais nas negociações com a comunidade financeira internacional.
Não é uma novidade nem algo
estranho aos organismos multilaterais como FMI e Banco
Mundial. Mais ainda, já há algum ceticismo sobre essa nova
forma de organizar as agendas
reformistas nos países pobres.
Se antes o foco da discussão
eram as privatizações como
condição de desenvolvimento,
agora há toda uma literatura
sobre como os setores de infra-estrutura privatizados podem
ser regulados para servir ao propósito de reduzir a pobreza.
Novas metodologias foram
criadas e começam a ser testadas para medir a qualidade e os
resultados das políticas sociais.
Amplia-se o debate sobre indicadores de desenvolvimento humano e modelos de ampliação
do "capital social", levando à
publicação de dezenas de pesquisas sobre os efeitos da corrupção sobre o crescimento econômico. Mas há dúvidas sobre a
eficácia desses projetos sociais.
Alguns integrantes do novo
governo, por exemplo, fizeram
críticas às políticas sociais do
governo FHC. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, chegou
a criticar a falta de coordenação
dos programas existentes. Técnicos e políticos que estão saindo preferiram não polemizar.
Mas o cientista social Vilmar
Faria, que atuou no desenho e
na coordenação de programas
sociais no governo FHC, pode
ser invocado postumamente para enriquecer o debate.
Num amplo diagnóstico, publicado postumamente pela Revista da Cepal em agosto do ano
passado (número 77, disponível
em http://www.eclac.cl), Faria
alertava para os riscos de centralização dos programas numa
"autoridade social", destacando
"a criação de câmaras setoriais
e mecanismos de integração de
políticas no lugar de estruturas
burocráticas de articulação".
Não se trata, portanto, de simplesmente afirmar que um ou
mais projetos sociais são prioritários (compromisso hoje presente no discurso de todos), mas
de aprofundar o debate sobre a
cultura política e os jogos de poder implícitos nesses projetos.
Essa é uma crítica interna à
idéia geral de prioridade ao social. Há outros debates em que a
questão crucial é a eficácia desses programas quando o modelo
de ajuste econômico permanece
basicamente o mesmo (a ortodoxia financeira neoliberal).
Nos textos do FMI e do Banco
Mundial, a adesão a princípios
econômicos conservadores é
condição de eficácia para as redes de proteção social que a comunidade financeira internacional estaria disposta a aceitar.
Mas há fontes mais críticas,
como a Unctad (Conferência
das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento),
para quem o fracasso das políticas de combate à pobreza resulta da manutenção de programas de ajuste econômico incompatíveis com a recuperação
do crescimento econômico. Sem
crescimento, não há programa
social que resolva.
O discurso oficial afirma que
não basta aderir às políticas
econômicas confiáveis, mas que
é crucial implementar programas diretos de combate à pobreza e transferência de renda. A
Unctad está dizendo praticamente o oposto: sem modelos de
ajuste favoráveis ao crescimento, os gastos sociais podem não
passar de maquiagem.
Um provável consenso contemporâneo é o de que a pobreza é um fenômeno complexo. A crítica interna e externa ao "tudo pelo social", no entanto, está
apenas começando.
Texto Anterior: Saiba mais: RFFSA acumula prejuízos pré e pós-privatização Próximo Texto: Opinião econômica: Chutando a escada Índice
|