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Cresce temor de novo calote na Argentina
Diante da dificuldade de o país obter crédito externo, bancos estrangeiros informam clientes sobre possível novo default
Agências classificadoras de risco reduzem notas do país e põem em dúvida eficiência das medidas para frear a perda de qualidade externa
ADRIANA KÜCHLER
DE BUENOS AIRES
Com dívida em alta e sem
acesso ao crédito internacional,
a Argentina volta a viver o fantasma do default, segundo informes de bancos estrangeiros
divulgados na semana passada
pela imprensa local.
"Os mercados começaram a
se perguntar se o país está à beira de outro default", diz o informe do Lehman Brothers, sob o
título "A Montanha-Russa da
Argentina". Em seu último relatório, o Morgan Stanley atestou que os elevados gastos públicos do país anularão o aumento da arrecadação.
Os informes vieram à tona
numa semana negativa para a
economia argentina. Na segunda-feira, a agência de classificação de risco Standard & Poor's
decidiu rebaixar a nota do país
de "B+" para "B", cinco níveis
abaixo do Brasil e do Peru e no
mesmo nível do Paraguai, longe
do grau de investimento.
O comunicado da agência
destaca "os crescentes desafios
econômicos e a baixa probabilidade de que o governo aplique
medidas corretivas para frear a
perda de qualidade creditícia".
Na quinta-feira, a agência
Moody's baixou a perspectiva
da economia argentina de "positiva" para "estável".
Na segunda-feira, a Argentina teve de comprar títulos de
sua dívida no mercado para
frear a forte tendência de queda
desses bônus, após a venda de
US$ 1 bilhão em títulos para o
governo da Venezuela, e dissolver os rumores sobre um novo
default no país.
A presidente argentina, Cristina Kirchner, criticou as agências classificadoras. "Há alguns
setores do "establishment" internacional que não nos perdoam pelo cancelamento da dívida com o FMI (Fundo Monetário Internacional)", disse ela.
Em 2001, o país entrou em
uma grave crise política e econômica e declarou o calote da
dívida, de US$ 144,22 bilhões,
equivalentes a 54% do PIB
(Produto Interno Bruto).
Em junho deste ano, a dívida
argentina superou pela primeira vez os valores de 2001.
"A Argentina tem imagem de
fraudadora no mercado externo. Sem credibilidade, ninguém quer emprestar dinheiro", diz Aldo Abram, diretor do
Centro de Pesquisa de Instituições e Mercados da Argentina.
Uma série de fatores, além do
default, teria destruído a credibilidade argentina no cenário
internacional, segundo o economista. Entre eles, estão a falta de reconhecimento dos "holdouts" -detentores de títulos
da dívida que não aceitaram a
renegociação feita em 2005-, a
dificuldade em negociar um débito de US$ 6,5 bilhões com o
Clube de Paris, que impede a
obtenção de financiamento externo, e a suspeita de manipulação do índice de inflação.
Gastos públicos
A Argentina precisa de financiamento já que o seu superávit
primário (economia do governo para pagar os juros da dívida) é de 3,5% do PIB, enquanto
necessita de 5% para se financiar. Apesar de manter bom nível de arrecadação, os gastos
públicos do país, com sua política de subsídios, crescem cerca
de 40% ao ano.
Nos últimos três anos, esse
financiamento veio da Venezuela, que comprou, desde então, US$ 6,3 bilhões em títulos
da dívida argentina.
"O país está isolado dos mercados internacionais desde
2001. É como se ainda estivesse
em default técnico. Nesse cenário, estamos condenados a depender do financiamento da
Venezuela", afirma o economista e ex-secretário de Indústria Dante Sica.
Há algumas semanas, a Argentina vendeu US$ 1 bilhão
em títulos a taxas de 15% ao governo da Venezuela. Em seguida, o governo venezuelano os
negociou com bancos do país,
que começaram a liquidá-los, o
que fez os bônus despencarem.
Segundo um representante
do Goldman Sachs citado pelo
jornal "La Nación", "é um paradoxo que um país que cresce a
taxas sólidas ainda careça de
acesso direto aos mercados e
tenha de pagar 15% para colocar sua dívida".
Os valores se recuperaram
com a recompra dos bônus pelo
governo na semana passada. O
ex-ministro da Economia Aldo
Ferrer, referência de Cristina
em temas econômicos, elogiou
a ação de tranqüilizar os mercados. "Os mercados são muito
temperamentais, às vezes se
movem por motivos que não
têm fundamentos em fatos. A
situação da Argentina é sólida e
é preciso transmitir segurança", disse à agência Telam.
Para os analistas, evitar o default é possível. "A fórmula é
gastar menos e arrecadar mais.
E negociar com o Clube de Paris para garantir outros financiamentos", diz Sica.
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