São Paulo, quinta-feira, 19 de janeiro de 2006

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ANÁLISE

TVs e teles travam batalha por celular

DANIEL CASTRO
COLUNISTA DA FOLHA

Representantes das grandes redes abertas de TV entregaram ontem aos ministros Dilma Roussef (Casa Civil) e Hélio Costa (Comunicações) uma carta endereçada ao presidente Lula em que não pedem que o governo escolha o padrão de TV digital A ou B, mas, sim, um sistema que tenha "robustez" para transmitir em alta definição (HDTV) e que tenha "mobilidade" e "portabilidade".
Mas, para as redes e até para o Ministério das Comunicações, o único sistema robusto, com recepção móvel (em celulares) e portátil (em carros) é o japonês.
O padrão europeu, segundo pesquisadores de TV digital, é semelhante ao japonês. Para as redes, no entanto, o europeu não interessa, porque foi desenvolvido para um continente que, por ter muitos países territorialmente pequenos, sofre escassez de freqüências e, portanto, privilegia o modelo "multicanal" -uma mesma freqüência pode ser usada para até quatro canais de TV.
O padrão americano não serve às redes porque ainda não oferece portabilidade e mobilidade, por ter sido desenvolvido para um país em que se vê TV pelo cabo.
Já faz seis anos que as TVs brasileiras se definiram pelos japoneses. Hoje, a confiança das redes na escolha, pelo governo, do padrão nipônico é tanta que um alto executivo de uma delas disse ontem à Folha que "o que vai valer é a posição dos radiodifusores", os "players" básicos do negócio, "e as relações comerciais externas".
Para as companhias telefônicas, "rivais" das TVs, os radiodifusores estão tendo espaço privilegiado nas negociações com o governo. As redes já tiveram várias reuniões com ministros envolvidos na decisão. Ao final de uma delas, em dezembro, foram convidadas para um café com o presidente.
O ministro Hélio Costa, ex-repórter da Globo, é visto como um grande aliado das TVs e defensor do sistema japonês (ele afirmou que os japoneses foram os únicos que se comprometem a abrir mão de royalties). Mas Costa teria a resistência de Dilma Roussef.
Por trás da decisão do padrão a ser adotado pelo Brasil estão lobbies poderosos. Além dos sistemas e governos americano, europeu e japonês, há pressões das redes de TV, dos fabricantes de televisores e das telefônicas.
Há bilhões em jogo (fala-se que a TV digital movimentará até US$ 100 bilhões no Brasil) e novas tecnologias que devem mudar o jeito de ver TV e o uso do televisor. Com isso, as redes temem a entrada das teles no negócio delas.
A disputa das TVs com as teles promete. As redes querem que o governo determine que o telefone celular seja um receptor de TV digital sem que o usuário pague por isso, o que aumenta o poder publicitário delas. Mas as operadoras de telefonia móvel, que investem cerca de R$ 1 bilhão por ano em subsídios à fabricação de celulares, também querem ganhar.
O governo diz que sua decisão levará em conta não só as preferências das TVs, mas também contrapartidas, como a adoção, pelos donos do padrão, de aplicações de interatividade desenvolvidas no Brasil. Pesarão ainda o tamanho do mercado internacional de cada padrão e garantias.
Para o consumidor, ou telespectador, a decisão faz muita diferença. A escolha do padrão poderá pesar diretamente em seu bolso e terminar em uma televisão digital de melhor ou pior qualidade.


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