São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2003 |
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+ livros "Euclides da Cunha - Esboço Biográfico" reúne as anotações e pesquisas sobre o autor de "Os Sertões" feitas ao longo de dez anos pelo crítico e professor da USP Roberto Ventura, morto no ano passado A VIDA EM SUSPENSÃO
Leopoldo Bernucci
Como "Um Paraíso Perdido",
obra inacabada, com a qual Euclides da Cunha nos teria dado
outro grande exemplo de seu
magnífico modo de narrar e analisar, a
biografia sobre o autor de "Os Sertões",
que Roberto Ventura vinha escrevendo,
foi também infelizmente interrompida
pela sua trágica morte no ano passado.
Igualmente trágico foi para o meio acadêmico o vácuo deixado pelo jovem biógrafo e um dos mais dedicados pesquisadores dos assuntos euclidianos. Lendo as
páginas de "Euclides da Cunha - Esboço
Biográfico", a partir de levantamento
realizado por Marcia Zoladz e Mario Cesar Carvalho nos arquivos dos computadores de Ventura, percebe-se que, embora a narrativa biográfica ainda estivesse
tomando corpo, a pesquisa histórica,
fundamental para qualquer texto do gênero, já estava praticamente terminada.
Para quem acompanhou de perto as
investigações biográficas de Ventura, como alguns de nós tivemos o prazer de fazer, intercambiando com ele opiniões,
notas e informações diversas ao longo de
uma década, percebe-se que nem todos
os temas que ele discutia com seus interlocutores se encontram nas páginas sobre a vida de Euclides.
Depois de estudá-la profundamente, a
preocupação constante que tinha Ventura com a relação ambivalente de Euclides
com a causa republicana deve ter ficado
aquém da expectativa do biógrafo nos
momentos de redação de seu texto. Se
bem que, quanto à pesquisa, o assunto tivesse sido esmiuçado por ele, por meio
do estudo dos vários episódios históricos
que direta ou indiretamente afetaram
Euclides, "Euclides da Cunha - Esboço
Biográfico" se limitou a aludir ao forte
republicanismo euclidiano que se desprende de sua poesia precoce, principalmente aquele encontrado nos muitos
poemas do caderno "Ondas". Certamente, essa visão incompleta é fácil de explicar. Deve-se ao fato de que a biografia
que Ventura preparava fosse ainda um
"work in progress".
Lamentavelmente, para o biógrafo não
houve suficiente tempo de preencher todas as lacunas de tão complexa narrativa
para dar conta dos momentos mais relevantes da vida de Euclides. Todos nós sabemos que Ventura era uma fonte inesgotável de informações, que não só eram
compartilhadas generosamente com os
colegas, mas que também estavam impecavelmente organizadas de modo a facilitar a longa e difícil investigação biográfica que ele vinha fazendo. Ironicamente,
para alguém que entendia tão bem as
agruras do tempo, o seu problema foi
justamente o de ter que lidar com o roer
das horas. Tão árduas e previsíveis foram
as horas de estudo para ele e tão insólita a
maneira como Ventura deu adeus à vida.
Se não tivemos a sorte de ver publicado
um texto de acabamento completo sobre
a vida de Euclides da Cunha, segundo as
exigências do gênero biográfico e as do
biógrafo, naquelas 600 páginas por ele
projetadas, foi-nos dada ao menos a
oportuna ocasião de constatar um truísmo válido para esse tipo de obra: pouco é
o número de páginas, mas extremamente correto o seu conteúdo. "Euclides da
Cunha - Esboço Biográfico" apresenta-se entre os tantos esboços biográficos sobre Euclides da Cunha já publicados,
mas com a garantia diferenciada de que a
sua pesquisa agora se fez, na maioria das
vezes, utilizando fontes primárias.
Leopoldo Bernucci é professor de literatura brasileira na Universidade do Texas, em Austin (EUA). É autor de "A Imitação dos Sentidos" (Edusp) e organizador da edição comentada de "Os Sertões" (Ateliê Editorial). Euclides da Cunha - Esboço Biográfico 352 págs., R$ 42,00 Mario Cesar Carvalho e José Carlos Barreto de Santana (orgs.). Companhia das Letras (r. Bandeira Paulista, 702, conjunto 32, CEP 04532-002, SP, tel. 0/ xx/11/3707-3500). Texto Anterior: + autores: A difícil unidade da América Latina Próximo Texto: Livro terá 1º lançamento hoje Índice |
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