São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2001

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No Paquistão, refugiados enfrentam ódio e preconceito

KIYOMORI MORI
FREE-LANCE PARA A REVISTA DA FOLHA,
EM SHAMSHATOO (PAQUISTÃO)


A melhor parte de Shamshatoo, o maior campo de refugiados afegãos do nordeste do Paquistão, parece no máximo uma favela piorada. Casas de pau-a-pique e mesquitas recém-construídas disputam o pouco espaço.
A pior parte do campo só tem barracas de lona desordenadas e bandos de crianças pedindo comida ou qualquer coisa.
O dinheiro é pouco, falta comida, saúde e educação, mas é nessa área de 45 km2 (pouco mais que duas vezes o arquipélago de Fernando de Noronha), a 30 km de Peshawar, que parte dos cerca de 2 milhões de refugiados afegãos têm a única chance de escapar do inferno da guerra.
Criado na década de 70 para abrigar os primeiros refugiados da invasão soviética, Shamshatoo tem 21 escolas e cinco postos de saúde. Ali convivem ONU e Taleban, ONG missionárias e organizações extremistas islâmicas.
As condições de saúde são ruins, diz o médico e refugiado Ahmad Karimi, 32, que trabalha em um dos postos de saúde. Doenças como cólera, febre tifóide e leishmaniose são comuns.
O cenário não é muito melhor nas escolas, mantidas pela ONU "Aqui, quando falta giz, a gente dá aula escrevendo no chão", afirma Saeed Mahboab, 45. Cerca de 90% dos alunos são órfãos de pai.
Cada barraca funciona como uma sala de aula. Espremidas em pouco mais de 15 m2, 35 crianças têm aulas de disciplinas como matemática e religião.
A temperatura na região chega facilmente a 50oC no verão. Dentro das barracas vai a 60oC. O professor Javid Sahaak, 42, diz que algumas crianças desmaiam.
A ONU afirma que não tem verba suficiente. "Nosso orçamento estimado para lidar com o problema dos refugiados nesses primeiros meses é de pelo menos US$ 50 milhões, e temos pouco mais de 30% dessa quantia", afirma Peter Kessler, 39, porta-voz da organização no Paquistão.
A ajuda oferecida pelo World Food Programe (Programa Mundial de Alimentação, um órgão da ONU) a cada refugiado é irrisória: 15 kg de trigo, 1 kg de lentilha e 0,75 litro de óleo por mês.
A falta de recursos gera conflitos e preconceitos dos paquistaneses contra os afegãos. Segundo a ONU, há 203 campos de refugiados no país, que não tem estrutura para isso. Os afegãos são acusados de causar desemprego, e há um clima de animosidade.
Só no último mês, cerca de 60 mil afegãos cruzaram a fronteira paquistanesa, engordando o contingente de 2 milhões que fugiram nos últimos 22 anos, quando começou a invasão soviética, em 1979.
Kessler, que esteve em campos de refugiados em Ruanda, Congo, Kosovo e Bósnia, faz um diagnóstico pessimista. "Este é o pior acampamento em que já trabalhei. Em Ruanda, a miséria era imensa, mas havia solidariedade, os vizinhos tentavam ajudar. Aqui, há ódio."
Vivendo de subempregos nas grandes cidades, não são poucos os que partem para a mendicância ou para atividades ilícitas, como o contrabando e o tráfico de drogas.
A ONU calcula que, se o conflito com os EUA e aliados se prolongar por mais de um ano, mais 1 milhão de pessoas devem fugir para o Paquistão.


Leia a reportagem completa no site www.uol.com.br/revista


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